Muito há a escrever sobre a evolução risonha do nosso sistema de contencioso administrativo! Regressemos aos tempos antigos da história politica e constitucional from old Brittain et de la France.
Primeiramente, ainda muito antes das Revoluções Liberais, o sistema administrativo era essencialmente caracterizado por uma indiferenciação das funções administrativa e jurisdicional. Significa que o poder se concentrava no Rei e à sua supremacia discricionária onde não se sabia, praticamente, o que denota o principio da legalidade imposto a órgãos independentes ( que não existiam) e onde os particulares se tinham de sujeitar aos “bons e maus humores” do seu Rei.
Acontecimentos: Ano 1688 - “The Glorious Revolution in England” ; 1789 – “ La Grande Révolution Française ”. O que sucedeu? Alterações nos respectivos sistemas administrativos. Surgindo assim dois novos modelos de administração: o sistema Britânico ou de administração judiciária ou sistema Anglo Saxónico segundo o Professor Freitas do Amaral, uma vez que o poder judicial imperou; ou também modelo subjectivista, segundo designação dada por Vieira de Andrade uma vez que foi dada grande relevância à tutela dos direitos dos particulares; por oposição ao sistema executivo ou de tipo francês, segundo a designação dada pelo Professor Freitas do Amaral - devido a autonomia do poder executivo relativamente aos tribunais – ou também modelo objectivista, segundo o Professor Vieira de Andrade, pois deu-se finalmente a devida importância ao principio da legalidade e à supremacia do interesse público.
Embora haja pontos de aproximação entre estes dois sistemas, houve uma evolução distinta nos dois pelo que temos de ter em consideração e, para uma melhor compreensão, tudo o que caracteriza cada um dos sistemas em análise. Houve uma forte fiscalização na actuação da Administração destes dois modelos, no Britânico, por parte dos tribunais comuns e, no Francês criaram-se Tribunais Administrativos para a realização do efeito. Para uma maior clareza e para não tornar esta explicitação demasiado longa e aborrecida para os mais interessados irei focar-me, essencialmente, nos pontos principais dos dois sistemas em causa e, separadamente, contando a sua evolução histórica. O progresso mais notório foi a afirmação do principio de separação de poderes – é muito conhecida entre nós a afirmação de Louis XIV : “ L’ État c’est moi” , antes da referida Révolution - que vai alterar, consequentemente o conceito de Estado existente nestes dois Países.
Comecemos a nossa história pelo sistema Britânico e por referir que o seu maior crescimento dá-se sobretudo quando o sistema francês já se encontrava numa espécie de segunda fase – a do baptismo. Os conceitos de rule of law, judicial supremacy : que se caracteriza essencialmente pela existência de poder genérico de revisão de qualquer acto administrativo atribuído aos tribunais e, de due process of law: uma vez que não existe nos países anglo-saxónicos o conceito de interesse legitimo da Administração. Concluímos que esta não tem legitimidade para agir sozinha pelo que qualquer decisão de um seu órgão que afecte terceiros só será imperativa depois da intervenção de um tribunal comum, excepto, é claro, se esta actuasse no uso dos summary powers em que pode executar motu próprio os seus actos. Deste modo deu-se aos tribunais o poder de controlar os órgãos da administração pública, idênticos ao que exercem sobre os actos privados o que gerou um ligeiro atraso no desenvolvimento sorridente do Contencioso Administrativo. O modelo administrativo Britânico tem assim como traço principal a sujeição da Administração aos tribunais comuns ou como os próprios designam os courts of law. A verdade é que houve sempre uma tendência britânica para o reforço do poder executivo de tal modo que quem saiu privilegiado foi os poderes legislativo e judicial. Tal característica evidencia uma certa desconfiança relativamente ao poder executivo, criada sobretudo desde os primórdios da common law que nos dá a sensação de uma administração propriamente dita, praticamente inexistente uma vez que é regulada e fiscalizada pelo direito privado ou comum. Tal como escreve o Professor Freitas do Amaral toda a Administração está submetida “ao direito comum, o que significa que por via desta regra não dispõem de privilégios ou prerrogativas de autoridade pública”. A ter algum poder semelhante a este, só se lhe for atribuído por lei especial sendo no entando uma expeção ao rule of law. Há uma grande aproximação ao sistema privado uma vez que os direitos, poderes e capacidade juridica paracem-nos iguais.
Em suma, como já afirmei, o direito regulador da Administração é o mesmo pelo que se regem os cidadãos de direito comum, não havendo deste modo lugar a qualquer tipo de privilégios de autoridade pública como afirmou o Professor Freitas Do Amaral. As decisões administrativas estavam sujeitas a sentença do tribunal para poderem revestir de eficácia e imperatividade determinadas decisões. Deste modo está assim vedado à administração Britânica a sua capacidade própria de execução das suas decisões sendo evidente a supremacia da intervenção dos Tribunais Comuns que gozam de grande amplitude de poderes. O benefício deste sistema é um eficaz combate a ilegalidades e abusos por parte da Administração que garante uma melhor protecção dos particulares e dos seus interesses. O self-restraint do juiz está auto-limitado na apreciação de questões administrativas, sobretudo quando estava em causa o uso de poderes discricionários. O juiz apenas agia nas situações em que a entidade administrativa claramente actuava fora dos poderes que lhe eram conferidos pela lei. E até então os tribunais consideravam que não possuíam qualquer poder para se pronunciarem sobre os procedimentos e actuação dos vários órgãos administrativos do governo. A judicial supremacy só surgiu no Acórdão American School Of Magnetic Healing vs. McAnnulty de 1902 que afirmou que toda actuação administrativa é passível de controlo judicial”. No Reino Unido criou-se os admistrative tribunals que não eram mais do que órgãos administrativos especiais com competência administrativa, mas também dotados de poderes jurisdicionais de controlo da actividade administrativa. O Professor Vasco Pereira da Silva afirma mesmo que: “quando se estabelece o controlo da actividade administrativa por um órgão especial (…) a última palavra deve caber sempre a um tribunal e não a um órgão administrativo especial, encontrando-se sempre garantido o recurso para os tribunais superiores da decisão de um (tribunal relativamente a questões de legalidade”. No entanto, actualmente o Direito Administrativo tem dignidade constitucional. O próprio Professor Vasco Pereira da Silva enaltece no seu manual o episodio do panfleto de 1987 que circulou pelos órgãos administrativos a informar os seus membros da “dimensão constitucional adquirida pelo controlo judicial da actividade administrativa”.
No desenvolvimento do sistema Britânico assistiu-se também a uma especialização do Contencioso Administrativo através da criação em 1977 no High Court de um tribunal especializado para conhecer de questões de Direito Administrativo a designada Queen`s Bench Division. A par disto surgiu a criação de uma forma de processo especial. Em 1992 o Tribunals and Inqueries Act nasceu a possibilidade de impugnação das decisões dos tribunais.
Concluindo, hoje em dia entende-se que qualquer medida que se possa criar que vise negar esta possibilidade é, nas palavra dos Professor Vasco Pereira da Silva discutível por razões constitucionais e atenta contra o direito de acesso à justiça presente no art. 6º da Convenção Europeia do Direitos do Homem.
Muito mais havia a dizer sobre o assunto, no entanto, apresentados os principais temas do sistema em causa, passemos à análise do sistema Francês uma vez que já corro o risco de me alongar demasiado.
No que respeita ao sistema Francês ou sistema de administração executiva este caracteriza-se, essencialmente, pela sujeição da Administração a tribunais próprios. A Revolução Francesa de 1789 marcou aquilo que o Professor Vasco Pereira da Silva chamou de “pecado original” e que consiste na “promiscuidade entre as tarefas de administrar e de julgar”. De facto após a Revolução os tribunais continuavam a ser constituídos por membros da antiga nobreza tornando-se um meio de resistência ao novo regime e continuidade a um sistema onde a separação de poderes não era evidente. O poder executivo surgiu verdadeiramente por via da Lei 16-24 de Agosto quando esta proibiu qualquer interferência do poder judicial na administração, impedindo o juiz de apreciar os actos da mesma, bem como de chamar à sua presença qualquer funcionário da administração para se pronunciar sobre os seu actos. Neste sentido foram então criados os tribunais administrativos: o primeiro terá sido o “Conseil d`État”, incumbidos de julgar a Administração, mas que não eram verdadeiros tribunais, tratando-se órgãos meramente consultivos que faziam parte da administração e que julgavam com independência outros órgãos desta. A razão de ser deste tribunais é justificada pelo Professor Freitas do Amaral afirmando que existe uma “interpretação peculiar do principio da separação dos poderes” e que hoje é conhecida como a “concepção rígida da separação de poderes”, ou seja, se o poder executivo não podia interferir no poder judicial, também o poder judicial, em caso algum, poderia interferir no funcionamento e gestão da Administração Pública. Era esta a lógica predominante. O Professor Vasco Pereira da Silva também faz uma observação sobre o tema dizendo que: “em vez de se reconhecer que julgar a Administração é ainda julgar, prefere-se considerar que julgar a Administração é ainda administrar”. Afinal?! No que ficamos?! Há aqui uma grande contradição. Concluímos que esta interpretação, em vez de garantir a autonomia dos poderes veio unir na Administração o poder de administrar e julgar.No entanto, segundo o Professor Vasco Pereira da Silva esta situação inverteu-se com o “milagre da jurisdicionalização” que o Professor denomina de baptismo. Tal situação consiste, em finais do século XIX e durante o século XX na progressiva transformação dos tribunais administrativos em verdadeiros tribunais. Como consequência o Direito Administrativo deixa assim de ser o direito que protege a administração e passa a privilegiar as relações com terceiros. O Direito Administrativo começa assim a poder regular as relações jurídicas administrativas. Como escreve Freitas do Amaral quando começou a surgir o Direito Administrativo e quando se aperceberam da sua importância, foi sempre com a ideia subjacente de que a administração e, simultaneamente, os seus órgãos e agentes, não se podiam assemelhar às posições dos particulares uma vez que prosseguem o interesse público e que para os seus actos e decisões serem eficazes e úteis, têm de dispor de poderes de autoridade necessários à realização do interesse publico em geral que, deveria estar acima dos diversos interesses particulares e individuais de cada um. Na terceira fase que sucedeu a partir da década de setenta do século XX, designada pelo Professor Vasco Pereira da Silva de “ crisma ou confirmação”, desdobrou-se essencialmente na afirmação jurisdicional e subjectiva do Contencioso Administrativo. Primeiro através da consagração em Lei Fundamental de verdadeiros modelos de Contencioso Administrativo, de seguida a equiparação dos tribunais administrativos aos tribunais comuns com idêntica natureza, e, consequentemente, a afirmação da independência das jurisdições administrativas, tal como já eram independentes as jurisdições comuns. E, em segundo lugar, esta situação adquire uma dimensão europeia com a União Europeia que tem uma extrema necessidade de conciliar as divergências de todos os seus Estados. Membros e que tem de impor um sistema comum, dentro do possível.
Concluído o riso da história do contencioso administrativo nos dois sistemas principais que marcaram o seu nascimento e passadas as fase de baptismo, crisma e confirmação, podemos concluir que, apesar da grande diferença dos dois sistemas inicialmente, pegando neste último ponto do surgimento da União Europeia, podemos completar que com o fenómeno da europeização o sistema tende a ser cada vez mais comum nos seus Estados Membros. Isto também porque os dois modelos têm em comum o facto de ambos procurarem alcançar a máxima eficiência e eficácia administrativa e o facto de pertencerem à União Europeia, tem vindo a contribuir para uma grande aproximação e caminho à sua unicidade, pois tem-se assistido a uma verdadeira homogeneização dos sistemas administrativos. Caminha-se no sentido do mais justo e eficiente e, ao longo dos anos vamos progredindo para um sistema cada vez mais perfeito que visa tutelar simultaneamente o interesse público de todos enquanto também protege os direitos e interesses dos particulares.
Primeiramente, ainda muito antes das Revoluções Liberais, o sistema administrativo era essencialmente caracterizado por uma indiferenciação das funções administrativa e jurisdicional. Significa que o poder se concentrava no Rei e à sua supremacia discricionária onde não se sabia, praticamente, o que denota o principio da legalidade imposto a órgãos independentes ( que não existiam) e onde os particulares se tinham de sujeitar aos “bons e maus humores” do seu Rei.
Acontecimentos: Ano 1688 - “The Glorious Revolution in England” ; 1789 – “ La Grande Révolution Française ”. O que sucedeu? Alterações nos respectivos sistemas administrativos. Surgindo assim dois novos modelos de administração: o sistema Britânico ou de administração judiciária ou sistema Anglo Saxónico segundo o Professor Freitas do Amaral, uma vez que o poder judicial imperou; ou também modelo subjectivista, segundo designação dada por Vieira de Andrade uma vez que foi dada grande relevância à tutela dos direitos dos particulares; por oposição ao sistema executivo ou de tipo francês, segundo a designação dada pelo Professor Freitas do Amaral - devido a autonomia do poder executivo relativamente aos tribunais – ou também modelo objectivista, segundo o Professor Vieira de Andrade, pois deu-se finalmente a devida importância ao principio da legalidade e à supremacia do interesse público.
Embora haja pontos de aproximação entre estes dois sistemas, houve uma evolução distinta nos dois pelo que temos de ter em consideração e, para uma melhor compreensão, tudo o que caracteriza cada um dos sistemas em análise. Houve uma forte fiscalização na actuação da Administração destes dois modelos, no Britânico, por parte dos tribunais comuns e, no Francês criaram-se Tribunais Administrativos para a realização do efeito. Para uma maior clareza e para não tornar esta explicitação demasiado longa e aborrecida para os mais interessados irei focar-me, essencialmente, nos pontos principais dos dois sistemas em causa e, separadamente, contando a sua evolução histórica. O progresso mais notório foi a afirmação do principio de separação de poderes – é muito conhecida entre nós a afirmação de Louis XIV : “ L’ État c’est moi” , antes da referida Révolution - que vai alterar, consequentemente o conceito de Estado existente nestes dois Países.
Comecemos a nossa história pelo sistema Britânico e por referir que o seu maior crescimento dá-se sobretudo quando o sistema francês já se encontrava numa espécie de segunda fase – a do baptismo. Os conceitos de rule of law, judicial supremacy : que se caracteriza essencialmente pela existência de poder genérico de revisão de qualquer acto administrativo atribuído aos tribunais e, de due process of law: uma vez que não existe nos países anglo-saxónicos o conceito de interesse legitimo da Administração. Concluímos que esta não tem legitimidade para agir sozinha pelo que qualquer decisão de um seu órgão que afecte terceiros só será imperativa depois da intervenção de um tribunal comum, excepto, é claro, se esta actuasse no uso dos summary powers em que pode executar motu próprio os seus actos. Deste modo deu-se aos tribunais o poder de controlar os órgãos da administração pública, idênticos ao que exercem sobre os actos privados o que gerou um ligeiro atraso no desenvolvimento sorridente do Contencioso Administrativo. O modelo administrativo Britânico tem assim como traço principal a sujeição da Administração aos tribunais comuns ou como os próprios designam os courts of law. A verdade é que houve sempre uma tendência britânica para o reforço do poder executivo de tal modo que quem saiu privilegiado foi os poderes legislativo e judicial. Tal característica evidencia uma certa desconfiança relativamente ao poder executivo, criada sobretudo desde os primórdios da common law que nos dá a sensação de uma administração propriamente dita, praticamente inexistente uma vez que é regulada e fiscalizada pelo direito privado ou comum. Tal como escreve o Professor Freitas do Amaral toda a Administração está submetida “ao direito comum, o que significa que por via desta regra não dispõem de privilégios ou prerrogativas de autoridade pública”. A ter algum poder semelhante a este, só se lhe for atribuído por lei especial sendo no entando uma expeção ao rule of law. Há uma grande aproximação ao sistema privado uma vez que os direitos, poderes e capacidade juridica paracem-nos iguais.
Em suma, como já afirmei, o direito regulador da Administração é o mesmo pelo que se regem os cidadãos de direito comum, não havendo deste modo lugar a qualquer tipo de privilégios de autoridade pública como afirmou o Professor Freitas Do Amaral. As decisões administrativas estavam sujeitas a sentença do tribunal para poderem revestir de eficácia e imperatividade determinadas decisões. Deste modo está assim vedado à administração Britânica a sua capacidade própria de execução das suas decisões sendo evidente a supremacia da intervenção dos Tribunais Comuns que gozam de grande amplitude de poderes. O benefício deste sistema é um eficaz combate a ilegalidades e abusos por parte da Administração que garante uma melhor protecção dos particulares e dos seus interesses. O self-restraint do juiz está auto-limitado na apreciação de questões administrativas, sobretudo quando estava em causa o uso de poderes discricionários. O juiz apenas agia nas situações em que a entidade administrativa claramente actuava fora dos poderes que lhe eram conferidos pela lei. E até então os tribunais consideravam que não possuíam qualquer poder para se pronunciarem sobre os procedimentos e actuação dos vários órgãos administrativos do governo. A judicial supremacy só surgiu no Acórdão American School Of Magnetic Healing vs. McAnnulty de 1902 que afirmou que toda actuação administrativa é passível de controlo judicial”. No Reino Unido criou-se os admistrative tribunals que não eram mais do que órgãos administrativos especiais com competência administrativa, mas também dotados de poderes jurisdicionais de controlo da actividade administrativa. O Professor Vasco Pereira da Silva afirma mesmo que: “quando se estabelece o controlo da actividade administrativa por um órgão especial (…) a última palavra deve caber sempre a um tribunal e não a um órgão administrativo especial, encontrando-se sempre garantido o recurso para os tribunais superiores da decisão de um (tribunal relativamente a questões de legalidade”. No entanto, actualmente o Direito Administrativo tem dignidade constitucional. O próprio Professor Vasco Pereira da Silva enaltece no seu manual o episodio do panfleto de 1987 que circulou pelos órgãos administrativos a informar os seus membros da “dimensão constitucional adquirida pelo controlo judicial da actividade administrativa”.
No desenvolvimento do sistema Britânico assistiu-se também a uma especialização do Contencioso Administrativo através da criação em 1977 no High Court de um tribunal especializado para conhecer de questões de Direito Administrativo a designada Queen`s Bench Division. A par disto surgiu a criação de uma forma de processo especial. Em 1992 o Tribunals and Inqueries Act nasceu a possibilidade de impugnação das decisões dos tribunais.
Concluindo, hoje em dia entende-se que qualquer medida que se possa criar que vise negar esta possibilidade é, nas palavra dos Professor Vasco Pereira da Silva discutível por razões constitucionais e atenta contra o direito de acesso à justiça presente no art. 6º da Convenção Europeia do Direitos do Homem.
Muito mais havia a dizer sobre o assunto, no entanto, apresentados os principais temas do sistema em causa, passemos à análise do sistema Francês uma vez que já corro o risco de me alongar demasiado.
No que respeita ao sistema Francês ou sistema de administração executiva este caracteriza-se, essencialmente, pela sujeição da Administração a tribunais próprios. A Revolução Francesa de 1789 marcou aquilo que o Professor Vasco Pereira da Silva chamou de “pecado original” e que consiste na “promiscuidade entre as tarefas de administrar e de julgar”. De facto após a Revolução os tribunais continuavam a ser constituídos por membros da antiga nobreza tornando-se um meio de resistência ao novo regime e continuidade a um sistema onde a separação de poderes não era evidente. O poder executivo surgiu verdadeiramente por via da Lei 16-24 de Agosto quando esta proibiu qualquer interferência do poder judicial na administração, impedindo o juiz de apreciar os actos da mesma, bem como de chamar à sua presença qualquer funcionário da administração para se pronunciar sobre os seu actos. Neste sentido foram então criados os tribunais administrativos: o primeiro terá sido o “Conseil d`État”, incumbidos de julgar a Administração, mas que não eram verdadeiros tribunais, tratando-se órgãos meramente consultivos que faziam parte da administração e que julgavam com independência outros órgãos desta. A razão de ser deste tribunais é justificada pelo Professor Freitas do Amaral afirmando que existe uma “interpretação peculiar do principio da separação dos poderes” e que hoje é conhecida como a “concepção rígida da separação de poderes”, ou seja, se o poder executivo não podia interferir no poder judicial, também o poder judicial, em caso algum, poderia interferir no funcionamento e gestão da Administração Pública. Era esta a lógica predominante. O Professor Vasco Pereira da Silva também faz uma observação sobre o tema dizendo que: “em vez de se reconhecer que julgar a Administração é ainda julgar, prefere-se considerar que julgar a Administração é ainda administrar”. Afinal?! No que ficamos?! Há aqui uma grande contradição. Concluímos que esta interpretação, em vez de garantir a autonomia dos poderes veio unir na Administração o poder de administrar e julgar.No entanto, segundo o Professor Vasco Pereira da Silva esta situação inverteu-se com o “milagre da jurisdicionalização” que o Professor denomina de baptismo. Tal situação consiste, em finais do século XIX e durante o século XX na progressiva transformação dos tribunais administrativos em verdadeiros tribunais. Como consequência o Direito Administrativo deixa assim de ser o direito que protege a administração e passa a privilegiar as relações com terceiros. O Direito Administrativo começa assim a poder regular as relações jurídicas administrativas. Como escreve Freitas do Amaral quando começou a surgir o Direito Administrativo e quando se aperceberam da sua importância, foi sempre com a ideia subjacente de que a administração e, simultaneamente, os seus órgãos e agentes, não se podiam assemelhar às posições dos particulares uma vez que prosseguem o interesse público e que para os seus actos e decisões serem eficazes e úteis, têm de dispor de poderes de autoridade necessários à realização do interesse publico em geral que, deveria estar acima dos diversos interesses particulares e individuais de cada um. Na terceira fase que sucedeu a partir da década de setenta do século XX, designada pelo Professor Vasco Pereira da Silva de “ crisma ou confirmação”, desdobrou-se essencialmente na afirmação jurisdicional e subjectiva do Contencioso Administrativo. Primeiro através da consagração em Lei Fundamental de verdadeiros modelos de Contencioso Administrativo, de seguida a equiparação dos tribunais administrativos aos tribunais comuns com idêntica natureza, e, consequentemente, a afirmação da independência das jurisdições administrativas, tal como já eram independentes as jurisdições comuns. E, em segundo lugar, esta situação adquire uma dimensão europeia com a União Europeia que tem uma extrema necessidade de conciliar as divergências de todos os seus Estados. Membros e que tem de impor um sistema comum, dentro do possível.
Concluído o riso da história do contencioso administrativo nos dois sistemas principais que marcaram o seu nascimento e passadas as fase de baptismo, crisma e confirmação, podemos concluir que, apesar da grande diferença dos dois sistemas inicialmente, pegando neste último ponto do surgimento da União Europeia, podemos completar que com o fenómeno da europeização o sistema tende a ser cada vez mais comum nos seus Estados Membros. Isto também porque os dois modelos têm em comum o facto de ambos procurarem alcançar a máxima eficiência e eficácia administrativa e o facto de pertencerem à União Europeia, tem vindo a contribuir para uma grande aproximação e caminho à sua unicidade, pois tem-se assistido a uma verdadeira homogeneização dos sistemas administrativos. Caminha-se no sentido do mais justo e eficiente e, ao longo dos anos vamos progredindo para um sistema cada vez mais perfeito que visa tutelar simultaneamente o interesse público de todos enquanto também protege os direitos e interesses dos particulares.
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