sábado, 8 de maio de 2010

Natureza Juridica do Recurso Hierárquico

Começando por definir hierarquia segundo o entendimento do Professor Freitas do Amaral, hierarquia, define – se por “um modelo de organização administrativa constituída por um grupo de órgãos e agentes com atribuições comuns e competência diferenciadas, ligados por um vínculo de subordinação que confere ao superior os poderes de direcção, superintendência e disciplinar, impondo aos subalternos os deveres de sujeições correspondentes”.
Quanto à natureza jurídica do recurso hierárquico levanta – se a questão de saber se é recurso hierárquico de tipo reexame ou pelo contrário, é recurso de revisão.
O Professor Freitas Do Amaral define os recursos de revisão como recursos que tenham por objecto o acto recorrido e de reexame como aqueles que incidindo sobre uma realidade mais ampla, implicam efectivamente um novo exame da causa.
Naturalmente há divergência na doutrina, dos autores que admitem a tipologia de reexame como principio regra no direito português temos o Prof. Marcelo Caetano, a sua primeira escrita relativa ao recurso hierárquico vem a propósito de um processo disciplinar, dizendo que “o recurso hierárquico implica um novo exame da questão em todos os seus aspectos pela autoridade superior que se substitui àquela de cuja decisão se recorre ( )“, o referido Professor reafirma posteriormente a sua posição com maior clareza numa adesão formal às concepções expostas pelo STA num Acórdão onde se conclui que “ a decisão de recurso hierárquico resolve o assunto como se fosse apreciado pela primeira vez aplicando a lei vigente à data em que tem lugar( )”.
Também se enquadrando neste grupo, o Professor Marcelo Rebelo de Sousa, sustenta que o recurso administrativo permite ao órgão “ad quem” o exercício da competência do órgão “a quo”, nos exactos termos em que este exerceu abrangendo as faculdades confirmativa, rogatória, modificativa e substitutiva. Se pelo contrário fosse recurso de mera revisão apenas se poderia verificar da legalidade ou do mérito do acto recorrido, confirmado - o ou revogado – o sem o poder modificar ou substituir, por exemplo, no caso da competência do órgão “a quo” ser exclusiva.
Em posição contrária temos o Prof. Freitas do Amaral, que considera que caso não haja outra solução estabelecida o recurso é de revisão. Considerando que o principal defeito da tese anterior reside no facto de encarar o recurso hierárquico como uma figura unitária e pretender os mesmos resultados para uma gama variada de situações. Dizendo ainda que a tese anterior parte do principio que a competência superior abrange o subalterno, e tal entendimento, a ser admitido, leva a que todas as situações sejam qualificadas como de reexame. O Prof. Freitas do Amaral fundamenta a sua crítica dizendo que para situações diferenciadas deve também haver soluções diferentes, como é o caso da competência delegada, competência própria ou reservada.
Estas representam as mais relevantes posições doutrinárias. Quanto ao CPA, uma vez solicitado recurso hierárquico da decisão tomada pelo órgão “a quo”, e estando reunidos todos os elementos que o habilitam à formação da vontade decisória num recurso hierárquico, o órgão “ad quem” pode: tomar decisão de rejeição de recursos (art. 173º CPA); negação de provimento (art. 174º/1 CPA); concessão de provimento (nº 2 do mesmo artigo). Está em causa aferir se o órgão, ao verificar do recurso, tem apenas poder de revogação da decisão recorrida ou se pode ir mais além, possuindo também a faculdade de substituição do acto impugnado por um outro acto com diferente disciplina jurídica para a mesma situação material.
Em relação ao CPA, parece relevante analisar o art. 174º nº1, seja qual for a competência do subalterno, o superior hierárquico poderá sempre revogar ou confirmar o acto recorrido sem sujeição ao pedido do recorrente: se a competência do autor não for exclusiva o autor do acto poderá ainda modificar ou substituir o acto recorrido. Assim o referido artigo confere ao superior hierárquico a faculdade de substituição revogatória de todos os actos recorridos, mesmo tratando se de actos definitivos, salvo se praticados ao abrigo da competência exclusiva.
Podemos então concluir que o recurso hierárquico assume, em regra, a natureza do recurso de reexame, excepto se o acto recorrido por praticado por um órgão “a quo” ao abrigo da competência exclusiva, situação em que o recurso hierárquico, pelo contrário assume a natureza de revisão.
Se o acto recorrido for delegado, o delegante poderá sempre revogar e substituir essa decisão, assim, o recurso assume sempre natureza de reexame. Se, por outro lado, o recurso fundar apenas mero poder de supervisionamento hierárquico, apenas compreende a faculdade revogatória, estando excluído o poder de substituição, salvo se houver disposição legal em contrário. Assim, determinar se o recurso assume natureza de reexame ou de revisão dependerá do que diz a lei sobre os poderes do órgão “ad quem”.
Em caso de recurso tutelar, tendo em conta o art. 177º podemos concluir que no recurso tutelar o órgão “ad quem” detém sempre o poder revogatório; o fundamento do recurso será, em regra, a legalidade do acto recorrido, salvo se a lei atribuir à entidade tutelar poderes de controlo de mérito da actividade do ente tutelado; a modificação ou substituição do acto recorrido apenas se mostra possível se a lei conferir poderes de tutela substitutiva à entidade tutelar dentro desses mesmos poderes. Por isso mesmo o recurso tutelar tem quase sempre natureza de recurso de revisão simples, excepto se a lei admitir poder de substituição da entidade tutelar, situação em que o recurso assume natureza de reexame.
Segundo, Vieira de Andrade, a tradição portuguesa do processo civil aponta no sentido de os recursos serem de revisão ou reponderação da sentença da primeira instancia e não de julgamento global da questão de mérito, mas a actual lei do processo administrativo não é muito clara quanto a essa opção.
Estas classificações são relevantes para efeitos de determinar o regime aplicável aos recursos das decisões de tribunais administrativos e para resolver os problemas de aplicação harmonizada das normas de legislação processual administrativa e da processual civil.
O recurso hierárquico diferencia-se dos outros tipos de recursos administrativos precisamente pela existência de hierarquia. O que significa que não existiria sem suporte hierárquico.

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