segunda-feira, 17 de maio de 2010

Parecer dos Magistrados do Ministério Publico Subturma9

Parecer dos Magistrados do Ministério Publico

EXMO SR. DR. JUIZ DE DIREITO DO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO DE
CÍRCULO E TRIBUTÁRIO DE LISBOA




Data:17.05.2010

Processo: nº1111

Magistrados: Cátia Dias, Inês Guisadas, João Maciel, Cátia Freire, João Conde e Luísa Invêncio

Descritores: Acção administrativa especial de impugnação de acto administrativo cumulada com acção de condenação à prática de acto devido




De acordo com os arts.1.º e 3.º do Estatuto do Ministério Público, art.219.º da Constituição da República Portuguesa e 85.º, n.º 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos compete ao Ministério Público representar o Estado e os interesses determinados por lei em defesa dos direitos fundamentais.



O Ministério Público apresenta as suas alegações:

I – DA PROVIDÊNCIA CAUTELAR

1. Cumpre desde já, e em primeiro lugar, pronunciarmo-nos sobre a procedência e oportunidade da providência cautelar, solicitada juntamente com a petição inicial do processo principal (art.114.º, n.º1, al. b), CPTA).

Para que a providência cautelar proceda, ter-se-ão de verificar os requisitos gerais do fumus boni iuris e do periculum in mora.

2. Com efeito, prevê o art.120.º, n.º1, al.a), CPTA, que as providências cautelares são adoptadas quando seja evidente a procedência da pretensão formulada ou a formular no pedido principal, designadamente por estar em causa a impugnação de acto manifestamente ilegal, de acto de aplicação de norma já anteriormente anulada ou de acto idêntico a outro já anteriormente anulado ou declarado nulo ou inexistente (art.120.º, n.º1, al.a), CPTA). Estamos aqui perante o requisito do fumus boni iuris necessário à procedência da providência. Deve, portanto, o tribunal avaliar o grau de probabilidade de êxito do processo principal. Atente-se que o critério do fumus boni iuris é chamado a desempenhar um importante papel neste domínio, como factor de racionalidade, enquanto elementar exigência de justiça, que se impõe no interesse de todos os envolvidos no processo. Sobretudo, no que respeita à Administração, ele é estabelecido no seu interesse e dos contra-interessados, na medida em que nem uns nem outros devem ficar à mercê do abuso da tutela cautelar por parte de quem faça valer pretensões infundadas[1].

3. É necessário ainda que se verifique o requisito do periculum in mora que se admite existir sempre que haja fundado receio da constituição duma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa ou pretende assegurar no processo principal e não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão formulada ou a formular nesse processo ou a existência de circunstâncias que obstem ao seu conhecimento de mérito (art.120.º, n.º1, als.b e c)).

4. Para além de que não haver periculum in mora no caso sub iudice, segundo o nosso parecer, parece-nos de todo o modo que a adopção da providência deverá ser recusada quando, devidamente ponderados os interesses públicos em presença e o facto de os danos resultantes da sua concessão se mostrarem superiores aos resultantes da sua recusa, podendo ser evitados ou atenuados pela adopção doutras providências (art.120.º, n.º2, CPTA). De qualquer maneira, foi iniciado um novo concurso (cfr.art.8.º da contestação, doc.2), pelo que a providência cautelar se torna deste modo inútil, a serem provados e dados como assentes os factos alegados na contestação. Deve, portanto, ser indeferida pelo Exmo. Sr. Dr. Juiz.

II – DA ACÇÃO PRINCIPAL

5. A não existência de procedimento concursal para o cargo de Director do Instituto do Emprego e da Formação Profissional foi justificado com base em justificados motivos de interesse público, o primeiro dos quais foi, com efeito, o facto de a função pública estar sujeita a severos cortes orçamentais. Na verdade, com respeito pela legalidade, deve a Administração Pública, v.g. os órgãos administrativos, prosseguir o interesse público (arts.3.º e 4.º CPA, e art.266.º CRP), no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos (cfr.art.12.º contestação).

6. O Presidente do Instituto do Emprego e da Formação Profissional justificou a nomeação com base na insuficiência de pessoal do serviço dirigente, facto impeditivo da abertura e realização dos concursos públicos dentro do prazo legal, tendo-se por isso visto obrigado a prolongar, a título de substituição, em mais dois meses, os mandatos dos directores regionais anteriores. Também aqui divisamos claramente motivos de interesse público na prorrogação do mandato anterior, com respeito do princípio da legalidade.

7. Ademais, o acto de nomeação não é inválido por força do art.24.º Lei n.º2/2004, pois permite a prorrogação do cargo por 90 dias, no caso de estarmos perante regime de comissão de serviço, na qual parece subsumir-se o presente caso.

8. Não foi abordada a questão da impugnabilidade do acto administrativo (art.51.º, n.º1, CPTA), não obstante ela relevar para o caso, embora à partida o acto seja impugnável. O acto administrativo é, neste caso, impugnável, uma vez que é lesivo dum interesse juridicamente atendível de AA, apesar de à partida podermos estar perante um acto administrativo com eficácia interna: o acto de nomeação. Acto administrativo com eficácia externa é claramente o concurso público.

9. Não é clarificada expressamente pelos Autores em que qualidade processual relevam as declarações dos sujeitos mencionados nos arts.14.º a 17.º da petição inicial (julgamos que como testemunhas, embora como tal não sejam indicadas).

10. A nomeação de JSD foi feita como nomeação em regime de substituição, nos termos do art.27.º, n.º1, Lei n.º51/2005.

11. Não divisamos o interesse no facto de os Autores alegarem a violação do direito de acesso à carreira e do princípio da igualdade, se depois daí não concluem com nenhuma pretensão de que a violação desses direitos seja facto constitutivo, nos termos gerais, excepto se os Autores fundarem a impugnação do acto com base na sua inconstitucionalidade e ilegalidade justamente por estes motivos, a cumular aos outros invocados, conquanto não tenha este ponto sido explícito no articulado. Parece-nos, mesmo, não haver violação do princípio da igualdade, dado ter havido motivo justificativo bastante para a sua não realização, i.e., a alegação de interesse público relevante por parte da Ministra e por parte do Presidente do Instituto. Se não, daí partiríamos para a conclusão precipitada e não fundamentada de que em qualquer acto de nomeação estaria a ser preterido o princípio da igualdade, quando assim não é.

12. Atente-se ainda no facto de que a interpelação da Ministra sobre a não realização e abertura de concurso público para o preenchimento do cargo só relevaria, se o interessado porventura tivesse recorrido aos meios graciosos que a lei lhe faculta: reclamação e/ou recurso administrativo. Não tendo sido esse o caso, terá mero efeito probatório a apreçar livremente pelo Exmo. Sr. Dr. Juiz, conquanto, em nossa opinião, e salvo melhor parecer, corrobora e fundamenta o interesse público subjacente ao acto de nomeação e à não abertura do procedimento concursal.

13. Não nos parece que proceda o art.2.º da contestação, na medida em que o acto impugnado parece estar indicado ou, pelo menos, resulta da acção quais os actos a impugnar. Por este motivo, não é a petição inepta (ex vi art.78.º, n.º2, al. d), CPTA), não devendo ser recusada pela secretaria que a aceitou, e bem.

14. Quanto ao facto de AA não preencher os requisitos do concurso ao cargo de Director, parece-nos relevante o facto de ter iniciado a sua carreira profissional na administração aos dezoito anos, visto ter apenas três anos de experiência profissional, não preenchendo um dos requisitos cumulativos do art. 20.º da Lei 2/2004 de 15 de Janeiro.

15. Quanto ao art.15.º da contestação, a excepção dilatória alegada pelos Réus procede, porquanto AA é parte ilegítima, na medida em que não há legitimidade por não ter interesse directo na acção, uma vez não preencher os requisitos necessários.

16. É ainda relevante a alegação da instância por inutilidade da mesma, dado o concurso ter sido já realizado e restabelecida a legalidade. Concluímos pela inutilidade da acção com extinção da instância, no caso de o Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito considerar, para efeitos probatórios, que se deu como facto assente que o novo concurso se realizou posteriormente.

17. Devemos ainda referir que, em nosso entender, a verdadeira pretensão dos interessados é a condenação da Administração ao acto legalmente devido (vd. art.66.º, n.2, CPTA). Contudo, não estando perante os casos das als. a) a c) do n.º1 do art.67.º, parece que os Autores interessados terão de abdicar da acção administrativa especial de condenação à prática do acto legalmente devido (arts.66.º e ss. CPTA). Estamos portanto, correctamente, perante uma situação subsumível na acção administrativa de impugnação de actos, não sendo concebível que recorramos ao art.51.º, n.º4, não obstante as considerações supra tecidas.

III – CONCLUSÃO

Em conclusão, entendemos ser de indeferir o pedido cautelar, na medida em que dele resultariam mais danos do que benefícios resultantes para os requerentes. Julgamo-lo ainda e também improcedente na medida em que se torna inútil em virtude de se ter iniciado procedimento concursal com vista à ocupação do cargo (inutilidade superveniente da providência cautelar).

Relativamente ao concurso público, efectivamente deveria ter ocorrido, contudo, não pode haver uma inexistência do cargo directivo, em defesa do interesse público. Deste modo, procede a contestação no art. 12.º e 14.º. Além disso, entende-se ter sido apenas um prolongamento do cargo pelo prazo de dois meses sendo, desde modo, um mero prolongamento temporário até ser aberto o concurso e ser prosseguido o procedimento legal.

Parece-nos, ainda, que os arts. 6.º e 7.º da contestação são procedentes, uma vez que AA tem apenas três anos de experiencia profissional.

Quanto à impugnação do acto, a questão não foi directamente suscitada pelas partes, embora nos pareça estar indicado, entendemos que, à partida, é impugnável. Relativamente à sua ineptidão referida na contestação, no art. 2º, não procede.

Quanto ao pedido de condenação da administração à prática do acto devido consideramos, por não caber nas als. a) a c) do n.º1 do art. 67.º CPTA, ser desnecessário, visto ter havido um concurso conforme vem anexado na contestação no seu documento dois.



[1] Vd, neste sentido, Mário Aroso de Almeida, O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos, p.294.

Cátia Dias

Cátia Freire

Inês Guisadas

Luísa Invêncio

João Conde

João Maciel

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