Recursos Jurisdicionais no Contencioso Administrativo
Em Portugal, embora não haja o assento constitucional de um segundo grau de jurisdição, a jurisprudência tem vindo fortemente a reconhecê-lo.
Assim, os recursos das decisões jurisdicionais no processo administrativos sofrem alterações, com base a sua especificidade, face ao Processo Civil (o regime está patente no art.140º e seguintes do Código do Processo nos Tribunais Administrativos, doravante CPTA).
Primeiramente, e no que respeita à legitimidade para recorrer da decisões, esta está atribuída a quem tenha ficado vencido com tal decisão, nomeadamente, as partes principais, os contra-interessados, quem não seja parte ou apenas seja parte acessória, resumidamente quem seja directamente prejudicado com a decisão. Para Vieira de Andrade, até mesmo quem tenha desistido da acção correspondente àquela sentença (art.141º/1CPTA). Seguindo um critério material, a legitimidade não é só para quem fique prejudicado com a decisão, mas também aqueles a que a decisão poderia ser ainda mais favorável. Quanto à situação das acções especiais de impugnação, o art.141º/2 e 3 do CPTA, vem dar relevância à susceptibilidade de renovação administrativa do acto anulado, bem como à admissibilidade de recurso, dito parcial, no caso das sentenças anulatórias. Este recurso “parcial” dá a possibilidade de apenas recorrer da parte da sentença que anulou o acto com fundamento em vícios de conteúdo. Já o Ministério Público que não pode renunciar aos recursos mas só desistir desses interpostos (art.681º/4 Código Processo Civil, CPC), intervém em defesa da legalidade dando o seu parecer sobre o mérito dos recursos, art.146º/1 CPTA.
O recurso deve ser interposto no prazo de 30 dias, incluindo as respectivas alegações; por uma justiça material, deve também haver um convite pelo tribunal de aperfeiçoamento dessas mesmas alegações para formular as ilegalidades imputadas à decisão recorrida, à luz dos artigos 144º/1 e 2, e 146º/3 CPTA, respectivamente.
Cabe agora analisar quais as decisões judiciais que não admitem recurso.
No regime administrativo português há a regra geral do direito ao recurso. Em termos de direito comparado, a situação é diferente: existe alguma resistência em nome da economia e celeridade processual, como é pautado na legislação processual alemã (1996), que admite como possibilidade de recurso apenas quando “ haja um questão de direito de importância fundamental” ou “ dúvidas sérias na sentença recorrida”.
Não se admite recurso nas decisões com base no poder discricionário legal (art.679ºCPC), nas decisões de pequena causa tendo em conta a alçada do tribunal (art.40º/3 ETAF), o que vem a suscitar várias dúvidas quanto à garantia da tutela efectiva (art.20º C.R.P.). As decisões proferidas em 2.ª instância, as decisões de decretamento provisório de providência cautelares para protecção de direitos, liberdades e garantias, bem como situações especiais de urgência, as decisões de conflitos de atribuições entre órgãos administrativos, não estão sujeitas a recurso, art.135º CPTA). Já as que admitem recurso são as sentenças finais, as decisões arbitrais e os despachos saneadores que conheçam o fundo da causa. Também é admitido recurso na execução de sentenças de anulação do acto administrativo, nos termos do art.142º/2 CPTA. É sempre admitido recurso no caso das decisões enunciadas o art.142º/3 do CPTA. Finalmente, o recurso é admitido ainda nas decisões proferidas em processos cautelares e interlocutórias que decidam questões prévias ou, por exemplo, as reclamações.
Vamos agora elencar os tipos de recursos possíveis na lei administrativa. Aqui, há um quadro dicotómico: entre recursos ordinários e recursos de revisão. Por um lado, os recursos ordinários podem, por sua vez, dividir-se em comuns(art.149ºCPTA): que se referem aos de apelação; o recurso de revista per saltum para o STA (art.151ºCPTA), onde se trata de analisar uma sentença ainda não transitada em julgado, trata-se só de questões de direito em que se exige uma valor particularmente elevado da causa e não se tratam de matérias de funcionalismo público ou de segurança social, garantindo a estabilidade na aplicação da justiça. Ainda dentro dos recursos ordinários está o de revista (conforme o art.150ºCPTA), este tem como fundamento a violação da lei substancial onde há uma necessidade óbvia de melhor aplicação do direito, foi exemplo disto o recurso no âmbito de uma processo cautelar popular na paragem das obras do túnel do Marquês de Pombal, em Lisboa. Neste tipo de recurso, há uma apreciação preliminar sumária dos pressupostos processuais por um conjunto de juízes e a finalidade deste recurso é conseguido pela alteração ou manutenção da 2.ª instância, estando assim em causa um terceiro grau de jurisdição. Para finalizar este tipo de recursos, falta-nos mencionar o recurso para a uniformização de jurisprudência referido no art.152ºCPTA, há uma contradição na mesma questão fundamental de direito entre acórdãos do STA ou do TCA, que quando a questão for resolvida anula-se e substitui-se a sentença impugnada. A finalidade deste recurso é impedir o tratamento desigual dos casos que são substancialmente iguais.
Por outro lado, existe o recurso de revisão, um recurso extraordinário de sentenças transitadas em julgado dirigido à própria entidade que a proferiu. Os fundamentos para este tipo de recurso são os que constam na letra do art.771ºCPC, bem como, as situações de falta de citação, de falta de oportunidade de intervenção ou aquelas em que alguém esteja prestes a sofrer a execução da sentença (art.155º/2 do CPTA).
Para concluir, vamos tratar dos efeitos dos recursos. De acordo com o art.143º/1do CPTA, a regra é de que o efeito da interposição do recurso é suspensivo da decisão em causa. Mas, há que referir as situações em que apenas traz um efeito devolutivo ao processo, que é o caso das situações do art.143/2 CPTA. Já quando os efeitos da sentença sejam susceptíveis de originar factos consumados ou prejuízos de difícil reparação, é este também um caso de efeito devolutivo, respeitando assim a letra da lei no mesmo artigo referido supra no n.º3. Acrescenta-se ainda que este mero efeito devolutivo é afastado quando os danos sejam superiores aos que resultem da sua não adopção.
Uma discussão na doutrina respeitante a este tema é o seu carácter substitutivo, que é a natureza dos recursos entendida na tradição portuguesa, isto significa que o tribunal quando dá provimento ao recurso vai substituir a decisão impugnada por aquela que entenda ser a mais adequada. Esta natureza contrapõem-se à cassatória, onde o tribunal apenas se limita a verificar a legalidade da decisão recorrida e remete, posteriormente, para o tribunal competente para que este proferira uma nova apreciação.
Elementos bibliográficos:
• ANDRADE, Vieira de, A Justiça Administrativa, Almedina, Coimbra, 2007
• ALMEIDA, Mário Aroso de, O Novo Regime do Processo Administrativo, Almedina, Coimbra, 2005
quinta-feira, 20 de maio de 2010
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