segunda-feira, 10 de maio de 2010

Tarefa 1 – Modelos de Justiça Administrativa

Sistemas Objectivista e Subjectivista – o caso Angolano

A história do Contencioso Administrativo é marcada por dois modelos opostos: o sistema francês ou objectivista e o sistema alemão ou subjectivista.

No modelo de tipo francês, o contencioso do direito administrativo consiste na existência de tribunais administrativos e tribunais comuns, independentes entre si, ou seja, a apreciação de qualquer situação em que a Administração Pública seja parte nunca é feita pelos tribunais comuns mas sim por tribunais administrativos que aplicam direito administrativo. O contencioso tem aqui uma função virada para a defesa da legalidade e do interesse público, pelo que os tribunais limitam-se, tão só, a declarar a invalidade dos actos praticados, permitindo-se apenas o recurso de anulação desses actos administrativos. Deste modo, é notória a despreocupação com os direitos subjectivos e com os interesses legalmente protegidos/garantias dos particulares, posição esta acentuada pelos efeitos “erga omnes” da sentença do caso julgado e pelo juízo de oportunidade da administração para a execução da sentença.

Relativamente ao modelo alemão, este centra-se numa maior protecção das garantias e interesses dos particulares, existindo, portanto, uma maior densificação da fiscalização da actividade administrativa, quer a nível material, quer procedimental. Neste sistema, os juízes têm competência de plena jurisdição, detendo amplos poderes decisórios sobre os actos da administração, os quais lhes permitem, até, tomar decisões contra a própria Administração Pública, nomeadamente, condená-la na prática de um determinado acto devido. Não se estranha, portanto, que se admita um recurso contencioso em toda a linha, bastando para tal que haja lesão de interesses e direitos dos particulares, desconsiderando-se a legalidade ou ilegalidade do acto em questão bem como a necessidade de precedência administrativa ou a existência de um acto definitivo. Uma última característica deste modelo subjectivista reside no facto de a sentença produzir efeitos apenas inter-partes e a sua execução ter carácter obrigatório.

Feita esta breve contraposição entre ambos os sistemas, será o sistema processual angolano de tipo objectivista ou subjectivista? A resposta parece ser clara, não deixando dúvidas quanto ao objectivismo do contencioso angolano. Este caracteriza-se pela existência de um recurso do contencioso administrativo, o qual trata da impugnação dos actos administrativos. Protege-se mais a legalidade e o interesse público do que os interesses e direitos subjectivos dos particulares, competindo ao juíz angolano, em matéria de recursos, pronunciar-se sobre actos administrativos ilegais (art.21º DL 4-A/96), não lhe sendo permitido que se substitua à Administração Pública ordenando a prática dos actos devidos por esta.
Há, porém, quem levante dúvidas quanto ao supra exposto, considerando que o sistema angolano poderá ser mais objectivista ou mais subjectivista consoante a interpretação que se faça do artigo 43º da Lei Constitucional de Angola, o qual dispõe que “os cidadãos têm o direito de impugnar e de recorrer aos tribunais contra todos os actos que violem os seus direitos estabelecidos”. E, de facto, aceitam-se os argumentos que levam Carlos Feijó e Cremildo Paca a questionar qual será o verdadeiro sistema do contencioso angolano. A questão resume-se a saber qual o sentido que o legislador ordinário quis dar ao supra mencionado artigo 43º: se, por um lado, estabelece que os particulares têm direito a recorrer aos tribunais para verem protegidos os seus direitos estabelecidos, por outro lado, apenas se admite recurso contencioso quando haja o pressuposto da definitividade do acto, não se prevendo também qualquer responsabilidade civil da Administração nem acção para o reconhecimento de um direito. O problema está então em saber se o legislador ordinário deu ou não a máxima execução ao artigo 43º. Tentando encontrar uma solução satisfatória, Carlos Feijó criou duas teses:
- a tese das opções, segundo a qual o legislador constitucional deixou ao critério do legislador ordinário a faculdade de optar por um modelo de contencioso administrativo, tendo este optado pelo modelo subjectivista, de raíz alemã;
- a tese da não efectividade, ou da não execução do direito à tutela jurisdicional efectiva, não tendo o legislador ordinário extraído a máxima efectividade do artigo 43º (não se prevendo o contencioso regulamentar para acções de responsabilidade civil ou de reconhecimento de um direito), pelo que está-se perante um contencioso administrativo de tipo francês/ objectivista.

Em suma, perante o exposto, parece o sistema angolano ser, de facto, objectivista pois as normas infra-constitucionais devem esgotar a letra e o alcance do artigo em questão; ao não se prever outros tipos de meios contenciosos além do contrato e/ou do acto, não se deu expressão efectiva e máxima ao preceito constitucional, pelo que o mesmo encontra-se quase inoperante.


Bibliografia
- "O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise" - Vasco Pereira da Silva
- “A Justiça Administrativa (Lições) ” – Vieira de Andrade
- “Direito do Contencioso Administrativo Angolano” – Cremildo Paca

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