quinta-feira, 29 de abril de 2010

A Impugnabilidade de Actos Preparatórios

A Impugnação de Actos Preparatórios:
A Definitividade Horizontal

O requisito da definitividade horizontal como pressuposto da precedência da acção de impugnação de actos foi alvo de muitas críticas pela doutrina tendo vindo a ser afastado.
O art.51º nº1 do C.P.T.A. refere que é impugnável o acto inserido num procedimento administrativo, desde que, tenha eficácia externa (especialmente os que lesem direitos ou interesses legalmente protegidos), o art.51º nº3 também prevê a possibilidade de impugnar actos procedimentais ao referir “que não ter impugnado qualquer acto procedimental não impede o interessado de impugnar o acto final com fundamento em ilegalidades cometidas ao longo do procedimento.”. Estes actos podem ser impugnados por quem tenha interesse na sua remoção da ordem jurídica, visto que estes podem produzir efeitos externos, embora ainda não se esteja perante o acto final mas apenas perante um acto inserido no procedimento administrativo. Para que a impugnação de actos procedimentais seja possível é necessário que estejam verificados dois pressupostos: um deles é a legitimidade para impugnar o acto e o outro é a verificação do interesse em agir. No fundo eles reconduzem-se ao interesse directo e pessoal previsto no art. 55º nº1al.a) do C.P.T.A.. No entanto, segundo Aroso de Almeida, deve excluir-se esta possibilidade do interessado impugnar actos procedimentais com eficácia externa se esse acto se revelar como um acto meramente preparatório na esfera jurídica do interessado (ou seja não se projecta na sua esfera jurídica). O art.51º nº3 salvaguarda a possibilidade de se impugnar o acto final, mesmo se o interessado não tiver impugnado o acto procedimental, com duas excepções:

1. O acto destacável – são actos que inseridos num procedimento produzem efeitos jurídicos externos autonomamente sem necessitarem do acto final, por exemplo, o acto que determina a exclusão do interessado do procedimento, este acto produz imediatamente efeitos externos, definindo de imediato a situação do interessado;

2. A lei especial – que imponha a tempestividade de actos procedimentais, sob pena de preclusão, ou seja, a existência de uma norma especial que refira que se aquele acto procedimental não for impugnado pelo interessado num determinado período não poderá ser posteriormente impugnado através da impugnação do acto final.

Para Vieira de Andrade surge o problema de saber se são impugnáveis as decisões administrativas preliminares (pré-decisões, pareceres vinculantes, etc.), que determinem peremptoriamente a decisão final de um procedimento com efeitos externos, mas que não tenham, elas próprias, capacidade para constituir esses efeitos externos, que só se produziram através com essa decisão final. Tem-se sustentado a impugnação destas decisões, como se fosse uma expressão de uma “defesa antecipada” dos interessados na impugnação (embora o acto só por si não tenha capacidade para produzir o efeito lesivo, apenas indirectamente o produz através da sua efectivação na decisão final) visto que em regra ou com um elevado grau de probabilidade irão criar lesões em direitos dos particulares. Este autor alerta para o facto de esta possibilidade não resultar directamente do art. 51º C.P.T.A. pelo que, por uma questão de certeza jurídica tal possibilidade deveria resultar expressamente de uma lei, não podendo daqui resultar um ónus de impugnação: visto que o não exercício de impugnar não poderia obstar à impugnação das decisões finais respectivas. Isto seria transformar numa desprotecção efectiva do interessado aquilo que deveria ser uma garantia do particular.
Ilustrativo desta conclusão é o acórdão do STA de 29 de Junho de 2006, processo 044141. Neste acórdão estava em causa se um Juiz poderia propor de imediato uma acção de anulação de uma deliberação do CTAF sem esperar pelo fim do procedimento. O CTAF instaurou um processo disciplinar, contra um Juiz, do qual poderia resultar para este a possível suspensão do exercício de funções e o congelamento da promoção da carreira. O STA decidiu que o juiz não poderia impugnar porque o acto preparatório não era lesivo dos direitos e interesses do juiz.
O STA decidiu que o acto preparatório, não directamente lesivo, não é como tal recorrível contenciosamente, e só a decisão final pode ser objecto de impugnação, aí podendo ser invocada qualquer ilegalidade reputada aos actos preparatórios do procedimento, com base no princípio da impugnação unitária. Isto só não será assim nos casos em que o acto preparatório tiver, em concreto, características de lesividade autónoma e imediata, desencadeando só por si (directamente) na esfera do interessado consequências lesivas imediatas, são os já anteriormente referidos actos destacáveis, fora destes casos só o acto final do processo disciplinar assumirá a natureza de acto lesivo, aí se podendo invocar todas as ilegalidades ocorridas no procedimento. Para o STA este entendimento está assente numa concepção finalista consagradora do princípio da impugnação unitária, que para o STA em nada ficou alterado com a revisão constitucional de 1989, ao nº4 do art. 268º C.R.P., nesta revisão constitucional a tónica da impugnação passou a ser a lesividade do acto deixando de ser decisivas as características de definitividade e executoriedade do art. 25º da L.P.T.A..
A lesividade referida no texto constitucional é objectiva e actual (actualidade da lesão) não meramente abstracta ou possível (potencialidade lesiva), ou seja, que altere objectivamente a ordem jurídica e visa definir uma concreta situação jurídico-administrativa. Isto não colide com a garantia de acesso à justiça do art. 20º da C.R.P., pois, a inimpugnabilidade contenciosa de actos preparatórios que não são dotados de lesividade autónoma e imediata, não implica qualquer supressão ou limitação do direito de ver apreciada a questão, art. 53º nº3 C.P.T.A.

Diferentemente, Vasco Pereira da Silva entende que houve uma extensão da impugnabilidade e portanto é possível a apreciação dos actos procedimentais, o que implica uma relevância jurídica autónoma do procedimento e o abandono definitivo da ideia de definitividade horizontal dos actos administrativos como critério de impugnabilidade dando cumprimento ao imperativo constitucional que tornou inconstitucional aquela exigência. Qualquer acto administrativo é susceptível de impugnação contenciosa se lesar os direitos dos particulares, incluindo todos os actos procedimentais, apenas interessa saber se o acto afecta imediatamente os direitos dos particulares não interessando se o acto foi praticado no início, no meio ou no fim do procedimento. O particular perante um acto lesivo dos seus direitos pode escolher entre impugnar desde logo essa actuação, ou esperar pela decisão final do procedimento, sem que o seu direito à protecção judicial seja afectado. Parece-me dever ser esta a doutrina a seguir.

Bibliografia:

1. Almeida, Mário Aroso de, O Novo Regime Do Processo Nos Tribunais Administrativos.
2. Andrade, José Carlos Vieira de, A Justiça Administrativa.
3. Silva, Vasco Pereira da, O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise.

Texto Elaborado Por:
Cláudia Elias
Nº16567
Subturma: 1.

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