terça-feira, 13 de abril de 2010

Tarefa 2: Legitimidade Processual - Velhos e Novos Problemas

Depois de termos estudado Processo Civil e de termos batalhado para tentar perceber as questões da legitimidade, uma primeira leitura dos arts. 9º e 10º do CPTA, não nos causou qualquer estranheza. Tal como no Processo Civil, o Contencioso Administrativo estabelece a legitimidade em função da relação material controvertida.Mas, como já nos temos vindo a aperceber, tudo o que existe hoje no Contencioso Administrativo não "nasceu" necessariamente assim, antes percorreu um longo caminho, ultrapassando sucessivos obstáculos. A problemática da legitimidade não é excepção.Tal como todo o Contencioso Administrativo, esta questão surgiu no modelo francês (que já aqui explicitámos), demonstrando uma lógica clássica, segundo a qual o Contencioso Administrativo era do tipo objectivo, era um "processo ao acto", "à mera verificação da legalidade de uma actuação administrativa", citando o Professor Vasco Pereira da Silva, na sua obra O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise; todo o processo girava em torno do acto administrativo, que era "tudo e todas as partes" (Nigro). Isto significava que o particular nunca ia ao processo defender um seu interesse. A sua presença suscitava-se apenas para colaborar com o tribunal na defesa da legalidade e do interesse público. Tal como a Administração, que estava em juízo como "autoridade recorrida", auxiliando o tribunal. Mas isto resultava da já tratada, promiscuidade entre Administração e a Justiça - tanto o tribunal como a Administração prosseguiam o mesmo fim, integrando-se, ambos, no poder do Estado. Tal como referia Marcelo Caetano (na obra Príncipios Fundamentais do Direito Administrativo), "o interesse da Administração é o mesmo que o do tribunal, está interessado no cumprimento preciso, inteligente, adequado,oportuno da lei".A promiscuidade foi afastada, em Portugal, com a Constituição de 1976, que integrou o Contencioso Administrativo no Poder Judicial. Ainda assim, o legislador continuava a referir-se à Administração como "autoridade recorrida".Hoje, o legislador é claro nos arts. 9º e 10º do CPTA, tanto o particular como a Administração são partes no processo administrativo. Além do queestá também consagrada a igualdade de participação no processo. É assim afastado o modelo objectivista. O particular pode agora estar em juízo para defesa dos seus direitos subjectivos, das posições substantivas de vantagem no âmbito da relação jurídica administrativa. Consagra-se ainda a possibilidade de acção pública e de acção popular (art.9º/2). Desta forma, o Contencioso Administrativo português é predominantemente subjectivo (art.9º/1), mas é também objectivo, assentando também na defesa da legalidade e interesse público (9º/2).No que diz respeito à legitimidade passiva, a Administração é também demandada para "defesa de uma determinada interpretação da legalidade e do interesse público".Apesar da evolução, subsistem alguns problemas na questão da legitimidade. Em primeiro lugar, é importante chamar a atenção para o facto de o legislador dar preferência à pessoa colectiva pública como sujeito passivo. Como refere o Professor Vasco Pereira da Silva, na obra já referenciada, " a noção de pessoa colectiva pública não parece estar mais em condições de poder continuar a funcionar como único sujeito de imputação de condutas administrativas, em razão da complexidade da organização administrativa e da natureza multifacetada das modernas relações administrativas multilaterais", antes há que considerar as autoridades administrativas. E, apesar da preferência do legislador, este parece também ter querido estabelecer uma certa abertura, no sentido de se autonomizar as diversas autoridades administrativas como sujeitos processuais, como se pode verificar pela leitura dos seguintes arts. : desde logo consagrou no art. 10º/2 uma excepção relativamente ao Estado; o art. 10º/4, parece também consagrar a regra alemã "segundo a qual quem deve estar em juízo é a autoridade administrativa responsável pelo comportamento litigado, ainda que se possa fingir que o faz em representação da pessoa colectiva"; por fim, o art. 10º/6 confirma todo este raciocínio.Outro problema surge com a questão da multilateralidade das relações administrativas: hoje em dia, a relação entre a Admnistração e os particulares não é, em regra, bipolar, colocando-se então a questão de saber "em que medida é que, num processo intentado pelo autor contra uma determinada autoridade administrativa, devem também ser chamados a juízo os demais sujeitos da relação multilateral, de modo a que o tribunal possa considerar todos os interesses em causa e emitir uma sentença produtora de efeitos em relação a todos os intervenientes da relação jurídica material". Perante esta situação, apesar de ainda não se verificar uma tendência relativamente às relações multilaterais, o legislador consagrou algumas regras relevantes neste âmbito: art. 12º (coligaçã0), art. 48º (processos em massa), art. 57º (contra-interessados).Contudo, há ainda um longo caminho a percorrer nesta matéria, quer pela doutrina, jurisprudência e também pelo legislador.Para terminar, resta-nos apenas referir que, para que o Contencioso Admnistrativo se "livrasse" da promiscuidade que o caracterizou nos seus primeiros anos, não podia auto-intitular-se como um "processo ao acto", antes tendo que se demonstrar como um processo de partes: de um lado o particular, do outro a Administração, perante um terceiro, o juiz.Cátia Martins, subturma 1216554

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