sexta-feira, 23 de abril de 2010

A legitimidade processual activa na acção administrativa especial

Saber quem tem legitimidade num processo é saber quem pode nele participar, mais concretamente é saber do lado activo quem o pode iniciar e do lado passivo contra quem este dever proposto.

No contencioso administrativo esta questão encontra-se inicialmente regulada no artigo 9º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (doravante CPTA) e posteriormente com algumas especificidades decorrentes do tipo de acção nos artigos 40º, 55º, 68º, 73º e 77º do CPTA, logo a análise da legitimidade activa deve fazer entre o artigo 9º e algum destes.

Começo então por analisar o artigo 9º/1, que prevê o regime geral da legitimidade activa e reproduz a regra já assente de qualquer relação jurídica controvertida, ou seja o autor é considerado parte legítima quando alegue ser parte na relação material controvertida. Sendo assim, a priori só quem fosse parte numa relação material controvertida é que poderia submeter a mesma a juízo, contudo tal seria muito redutor e deixaria sem qualquer possibilidade de reacção entidades que não sejam parte nas ditas relações, mas vejam os seus interesses e direitos lesados, para tal o artigo 9º/2 dispõe de um regime especial que estende o a legitimidade processual a quem não alegue ser parte na relação material controvertida, mas tenha um interesse pessoal na demanda ou o processo se destine à defesa de bens e valores constitucionalmente protegidos (referidos no 9º/2).

Este nº 2 compreende entidades como o Ministério Público e as autarquias locais, tendo preferencialmente em vista conceder aos cidadãos o direito de acção popular (que também já lhes é reconhecido pela Constituição da República Portuguesa, no seu artigo 52º/3). De ressalvar que os processos intentados ao abrigo deste artigo 9º/2 sofrem adaptações à tramitação normal, por força dos artigos 13º e seguintes da Lei 83/95, de 31 de Agosto (Lei de participação procedimental e de acção popular), não estamos aqui perante outra forma de processo, mas antes perante algumas especialidades que devem ser tidas em conta.



Passo agora à análise do tema que me propus, ou seja a legitimidade activa na acção administrativa especial, sendo que como já referi independentemente da forma de processo e do tipo de acção a análise da legitimidade deve iniciar sempre pelo artigo 9º do CPTA.

Temos quatro tipo de pretensões que o CPTA exige que sejam tramitadas segundo a forma de acção administrativa especial e para cada uma delas temos uma regra especial que alarga a legitimidade activa para além dos limites previstos no artigo 9º.

Assim e seguindo a ordem do CPTA, começo pela acção para a impugnação de acto administrativo, cuja a regra de legitimidade está prevista no artigo 55º.

No 55º/1 alínea a) atribui-se legitimidade “a quem alegue ser titular de um interesse directo e pessoal, designadamente por ter sido lesado pelo acto nos seus direitos e interesses legalmente protegidos”, aqui o relevante é que o impugnante tenha um interesse directo e pessoal na impugnação do acto, nomeadamente (sendo que podem verificar-se outras causas que originem o tal interesse) por este o ter lesado nos seus direitos e interesses. A anulação ou declaração de nulidade do acto tem de representar uma vantagem imediata para o impugnante.

O interesse referido na alínea em causa tem de obedecer a dois requisitos, tem de ser “pessoal” o que se relaciona com o carácter imediato da vantagem que a impugnação do acto tem de surtir no impugnante, ou seja tem de haver uma utilidade pessoal que se traduz no facto de o impugnante ser o titular do interesse em nome do qual se move o processo. Tem também de ser “directo”, no sentido de ter ser actual e de a anulação ou declaração de nulidade do acto, ter ainda a possibilidade de minorar a lesão provocada nos direitos e interesses legalmente protegidos, posto isto o carácter directo do interesse prende-se mais com o interesse processual do que com a legitimidade, pois está aqui em causa saber se a tutela judiciária é realmente necessária.

No 55º/1 alínea b) atribui-se legitimidade ao Ministério Público, o que se compreende sendo este o titular da acção pública (artigo 51º do ETAF).

No 55º/1 alínea c) temos as pessoas colectivas tanto as públicas como as privadas, sendo que estas actuam ao abrigo do princípio da especialidade.

No 55º/1 alínea d) encontra-se a possibilidade (inovadora) de um orgão administrativo impugnar actos praticados por outros orgãos da mesma pessoa colectiva, o que origina litígios dentro da mesma pessoa colectiva.

O 55º/1 alínea e) atribui legitimidade aos presidentes de orgãos colegiais de impugnarem actos praticados por esses orgãos, mas apenas nos casos previstos na lei. Encontramos um desses casos no 14º/4 do Código de Procedimento Administrativo.

Quase a terminar temos a alínea f) que volta a referir as pessoas e entidades do 9º/2, de referir que o Ministério Público age ao abrigo da alínea b) e não com as limitações do 9º/2.

Por fim temos o 55º/2 que prevê a acção popular local ou autárquica.



Passo agora pra a acção de condenação à prática de acto devido, que tem a sua regra de legitimidade no artigo 68º do CPTA. Temos neste caso cinco categorias de pessoas e entidades legitimadas a pedir a condenação à prática de um acto administrativo legalmente devido.

Na alínea a) tem legitimidade quem alegue ser titular de um direito ou interesse legalmente protegido, dirigido à emissão do acto ilegalmente omitido ou recusado. Aqui diferentemente do que acontece no 55º/1 a) não basta a invocação pelo autor, da titularidade de um mero interesse directo e pessoal, é necessário que o autor demonstre que tem efectivamente um direito ou um interesse legalmente protegido à emissão de um acto. O que prende com o facto de neste tipo de pretensão, o autor requerer a prática de um acto que já tinha sido pelo próprio pedido anteriormente à Administração e por esta lhe foi ilegalmente recusado ou omitido.

Tal como prevê o 55º/1 alíneas c) e f) também o 68º/1 atribui legitimidade a essas pessoas e entidades nas suas alíneas b) e d), respectivamente. Mantendo-se aqui todas as considerações feitas a propósito das mesmas.

Também neste tipo de acções é concedida legitimidade ao Ministério Público (alínea c) mas aqui com algumas limitações, ou seja circunscreve-se às situações de omissão ilegal em que o dever de praticar o acto administrativo resulte directamente da lei e esteja em causa a ofensa de direitos fundamentais, de um interesse público relevante ou de qualquer dos valores e bens referidos no 9º/2. Assim a acção do Ministério Público além de se dirigir ao cumprimento da lei ter de ter um vista a defesa de valores constitucionalmente protegidos.



Como terceiro tipo de pretensão temos as acções de impugnação de normas regulamentares, cuja legitimidade está prevista no artigo 73º/1, 2, 3 e 4 do CPTA, de forma explícita, não levantando quaisquer problemas.



Por último temos a acção destinada a pedir a declaração de ilegalidade por omissão de normas regulamentares, cuja legitimidade está regulada no artigo 77º/1 do CPTA.


Realizado pela aluna Erica Ferreira Gomes, da subturma 1

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