Gostaria de partilhar com todos um acórdão recente do STA, que trata de vários temas relevantes no âmbito desta cadeira, nomeadamente problemas de incompetência e de legitimidade.
O acórdão apesar de não primar pela extensão, que a meu ver seria desejável ser reduzida, é de facil compreensão e aborda os problemas de uma forma muito clara. Assim sendo vou deixar as referências relativas ao acórdão em questão, para que quem esteja interessado possa analisar o mesmo:
Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0278/09
Data do Acordão:03-03-2010
Tribunal:2 SUBSECÇÃO DO CA
Votação:UNANIMIDADE
Antes de fazer um breve comentário resultante da minha análise e estudo da matéria tratada, deixo-vos ainda o sumário para facilitar o processo às pessoas que, apesar de não interessadas em fazer uma análise extensiva do acórdão, ainda assim gostariam de captar o essencial.
Sumário:
I - A personalidade judiciária (inerente à personalidade jurídica) consiste na susceptibilidade de ser parte traduzindo-se na possibilidade de requerer ou de contra si ser requerida, em próprio nome, qualquer das providências de tutela jurisdicional reconhecidas na lei.
II - Os Ministérios não possuem personalidade jurídica para os termos de uma acção com vista a efectivar responsabilidade civil extracontratual.
III - Numa acção instaurada contra um Ministério a sanação da falta de personalidade judiciária não é possível, e não sendo sanável também não pode ser objecto de suprimento nos termos do disposto nos art°s 508°, n° 1, alo a), 265°, n° 2, ou dos artºs 325° e segs. do CPC, determinando a absolvição da instância, nos termos do preceituado no artigo 288º, nº 1, alínea c), do Código de Processo Civil
IV - Tal solução não viola o direito de acesso à tutela jurisdicional efectiva, consagrado nos artºs 20º e 268º nº 4 da CRP.V - O n° 7 do art. 10° do CPA configura uma regra de legitimidade plural passiva, que permite que a acção seja proposta, não apenas contra os entes públicos, mas também contra todos os outros interessados (ainda que sejam particulares), quando o envolvimento destes se situe ainda no âmbito de uma relação jurídica administrativa;
VI - Sendo esse o caso de numa acção com vista à efectivação da responsabilidade civil extracontratual contra duas entidades (Estado e entidade proprietária de um Jardim de Infância integrado na rede escolar pública), inseridas numa relação jurídico-administrativa com os autores da acção e em que é imputada a verificação de um acidente escolar de que resultaram os eventos danosos, ser também imputada responsabilidade na produção do mesmo acidente à entidade (particular) proprietária de um complexo de piscinas.
VII - Na situação anteriormente descrita, estando definida a competência da jurisdição administrativa por força da natureza da relação jurídica que intercede entre os AA. e as referidas entidades públicas, ao abrigo do disposto no art. 10º n° 7 do CPTA, também a acção podia ser proposta, contra a referida entidade particular.
VIII - Face ao preceituado no artº 1893.º, nº 1, do Cód. Civ., falece legitimidade aos pais responsáveis pela prática de actos ilegais [em contravenção ao disposto no seu artigo no 1889.º nº 1, alíneas i) e o)] para requerer a sua anulação.
Efectivamente os ministérios são meros departamentos de organização dos orgão e serviços do seu orgão central Governo, dirigidos pelos respectivos ministros, sem qualquer tipo de personalidade jurídica ou judiciária. A personalidade judiciária é inerente à personalidade juridica; trata-se de condição para ser parte e requerer ou contra si ser requerida qualquer das providências de tutela jurisdicional reconhecidas na lei. Nas acções de responsabilidade civil da administração pública, seja contratual ou extra-contratual, aplicam-se por remissão do artigo 72/1 da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos aplicamse as regras e princípios do Código de Processo Civil; observar isto significa que nos termos do 494C), 495 e 288/1,c) da LPTA, a falta de personalidade judiciária é uma excepção dilatória de conhecimento oficioso. A falta de personalidade judiciária, sem prejuizo do disposto no artigo 8 do CPC é um pressuposto processual insuscéptivel de sanação.Como aliás refer o Professor Castro Mendes " A personalidade judiciária ocupa um lugar muito especial entre os pressupostos processuais (como a personalidade juridíca enter os "status"): é o pressuposto dos restantes pressupostos subjectivos relativos às partes". Se falta personalidade judiciária nã há parte.
No acórdão o Tribunal refere a insusceptibilidade de sanação, no caso dos autos, da falta de personalidade judiciária da Ré, nomeadamente através das formas sugeridas pela Recorrente nas saus alegações; assim ao não admitir aquela sanação, conclui no sentido de que a setença recorrida não incorreu em qualquer violação das normas ou preceios legais, designadamente das apontadas pela Recorente nas respectivas alegações.
O artigo 10/2 CPTA corresponde a uma inovação em matéria de legitimidade passiva nos processos que tenham por objecto o exercicío ( ou a recusa ) de poderes de autoridade para a emissão de normas ou actos administrativos da autoria de determinado orgão de um ente público, ou seja, nos processos da acção administrativa especial.
Importa ainda fazer referência, a titulo de conclusão, ao artigo 212 CRP segundo o qual "compete aos tribunais adminstrativos e fiscais o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais".
Recomendo a leitura deste acórdão porque alêm de abordar de forma clara temas importantes no âmbito de contencioso administrativo, contêm várias e importantes referências a doutrina.
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