domingo, 23 de maio de 2010

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo

Gostaria de partilhar com todos um acórdão recente do STA, que trata de vários temas relevantes no âmbito desta cadeira, nomeadamente problemas de incompetência e de legitimidade.
O acórdão apesar de não primar pela extensão, que a meu ver seria desejável ser reduzida, é de facil compreensão e aborda os problemas de uma forma muito clara. Assim sendo vou deixar as referências relativas ao acórdão em questão, para que quem esteja interessado possa analisar o mesmo:

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0278/09
Data do Acordão:03-03-2010
Tribunal:2 SUBSECÇÃO DO CA
Votação:UNANIMIDADE

Antes de fazer um breve comentário resultante da minha análise e estudo da matéria tratada, deixo-vos ainda o sumário para facilitar o processo às pessoas que, apesar de não interessadas em fazer uma análise extensiva do acórdão, ainda assim gostariam de captar o essencial.

Sumário:
I - A personalidade judiciária (inerente à personalidade jurídica) consiste na susceptibilidade de ser parte traduzindo-se na possibilidade de requerer ou de contra si ser requerida, em próprio nome, qualquer das providências de tutela jurisdicional reconhecidas na lei.
II - Os Ministérios não possuem personalidade jurídica para os termos de uma acção com vista a efectivar responsabilidade civil extracontratual.
III - Numa acção instaurada contra um Ministério a sanação da falta de personalidade judiciária não é possível, e não sendo sanável também não pode ser objecto de suprimento nos termos do disposto nos art°s 508°, n° 1, alo a), 265°, n° 2, ou dos artºs 325° e segs. do CPC, determinando a absolvição da instância, nos termos do preceituado no artigo 288º, nº 1, alínea c), do Código de Processo Civil
IV - Tal solução não viola o direito de acesso à tutela jurisdicional efectiva, consagrado nos artºs 20º e 268º nº 4 da CRP.V - O n° 7 do art. 10° do CPA configura uma regra de legitimidade plural passiva, que permite que a acção seja proposta, não apenas contra os entes públicos, mas também contra todos os outros interessados (ainda que sejam particulares), quando o envolvimento destes se situe ainda no âmbito de uma relação jurídica administrativa;
VI - Sendo esse o caso de numa acção com vista à efectivação da responsabilidade civil extracontratual contra duas entidades (Estado e entidade proprietária de um Jardim de Infância integrado na rede escolar pública), inseridas numa relação jurídico-administrativa com os autores da acção e em que é imputada a verificação de um acidente escolar de que resultaram os eventos danosos, ser também imputada responsabilidade na produção do mesmo acidente à entidade (particular) proprietária de um complexo de piscinas.
VII - Na situação anteriormente descrita, estando definida a competência da jurisdição administrativa por força da natureza da relação jurídica que intercede entre os AA. e as referidas entidades públicas, ao abrigo do disposto no art. 10º n° 7 do CPTA, também a acção podia ser proposta, contra a referida entidade particular.
VIII - Face ao preceituado no artº 1893.º, nº 1, do Cód. Civ., falece legitimidade aos pais responsáveis pela prática de actos ilegais [em contravenção ao disposto no seu artigo no 1889.º nº 1, alíneas i) e o)] para requerer a sua anulação.

Efectivamente os ministérios são meros departamentos de organização dos orgão e serviços do seu orgão central Governo, dirigidos pelos respectivos ministros, sem qualquer tipo de personalidade jurídica ou judiciária. A personalidade judiciária é inerente à personalidade juridica; trata-se de condição para ser parte e requerer ou contra si ser requerida qualquer das providências de tutela jurisdicional reconhecidas na lei. Nas acções de responsabilidade civil da administração pública, seja contratual ou extra-contratual, aplicam-se por remissão do artigo 72/1 da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos aplicamse as regras e princípios do Código de Processo Civil; observar isto significa que nos termos do 494C), 495 e 288/1,c) da LPTA, a falta de personalidade judiciária é uma excepção dilatória de conhecimento oficioso. A falta de personalidade judiciária, sem prejuizo do disposto no artigo 8 do CPC é um pressuposto processual insuscéptivel de sanação.Como aliás refer o Professor Castro Mendes " A personalidade judiciária ocupa um lugar muito especial entre os pressupostos processuais (como a personalidade juridíca enter os "status"): é o pressuposto dos restantes pressupostos subjectivos relativos às partes". Se falta personalidade judiciária nã há parte.
No acórdão o Tribunal refere a insusceptibilidade de sanação, no caso dos autos, da falta de personalidade judiciária da Ré, nomeadamente através das formas sugeridas pela Recorrente nas saus alegações; assim ao não admitir aquela sanação, conclui no sentido de que a setença recorrida não incorreu em qualquer violação das normas ou preceios legais, designadamente das apontadas pela Recorente nas respectivas alegações.
O artigo 10/2 CPTA corresponde a uma inovação em matéria de legitimidade passiva nos processos que tenham por objecto o exercicío ( ou a recusa ) de poderes de autoridade para a emissão de normas ou actos administrativos da autoria de determinado orgão de um ente público, ou seja, nos processos da acção administrativa especial.
Importa ainda fazer referência, a titulo de conclusão, ao artigo 212 CRP segundo o qual "compete aos tribunais adminstrativos e fiscais o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais".

Recomendo a leitura deste acórdão porque alêm de abordar de forma clara temas importantes no âmbito de contencioso administrativo, contêm várias e importantes referências a doutrina.

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