sexta-feira, 21 de maio de 2010

O recurso hierárquico (des)necessário

Dentro da acção administrativa especial, mais concretamente na matéria da impugnação dos actos administrativos, encontramos a problemática do recurso hierárquico necessário.

Trata-se de um meio gracioso de impugnar decisões administrativas, a par da reclamação, que se diferenciam quanto ao destinatário: no primeiro é o superior hierárquico e no segundo será o próprio autor do acto.

A antiga LPTA (art. 25º) previa o recurso hierárquico necessário como pressuposto da acção de impugnação, ao contrário do que parece hoje resultar do CPTA, ao não lhe fazer menção expressa.
Passo a explicar: anteriormente, para que um particular pudesse impugnar um acto da Administração que lesasse os seus direitos ou interesses, teria primeiro que recorrer à via graciosa mediante reclamação ou impugnação administrativa e só depois recorrer aos tribunais administrativos. Após a revisão constitucional de 1989, deixou de se fazer referência à necessidade do recurso ser interposto contra actos definitivos e executórios, o que pressupõe a não necessidade do recurso hierárquico necessário, passo a redundância.

O Professor Vasco Pereira da Silva vem, já anteriormente à revisão, defender a inconstitucionalidade deste meio gracioso, por violação, entre outros, dos art. 268º/4 e 267º/2 CRP). Não era este o entendimento, porém, da doutrina e da jurisprudência.

Mesmo hoje, Freitas do Amaral e M. Aroso de Almeida entendem que o recurso hierárquico necessário continua a ser uma exigência quando houver norma especial nesse sentido, entendendo os Autores que a figura apenas desapareceu como regra geral. Contrariamente entende o Prof. Vasco P. da Silva, ao considerar que a norma geral que previa o recurso hierárquico necessário caducou, bem como todas as futuras que prevejam essa exigência.

Nos termos na CRP (art. 268º/4, após revisão 89), parece que a "necessidade" deste meio gracioso se afere à luz de um critéio de lesividade, ao passo que na LPTA (art. 25º) se aferia segundo critérios de definitividade e executoriedade. Assim, concluiu-se a inconstitucionalidade superveniente deste último artigo.

Hoje, entende-se que a impugnação, pelos particulares, terá lugar quando houver potencialidade de lesão dos seus direitos e interesses: trata-se de aferir o efeito negativo da decisão na esfera jurídica dos particulares.
No entanto, a jurisprudência continua a aferir a lesividade com base em critérios de definitividade.


Freitas do Amaral vem, a este respeito, defender a teoria da tripla definitividade, segundo a qual a última palavra da administração pode ser entendida como:
a) o acto final / decisão (definitividade horizontal)
b) a palavra do último orgão / topo da hierarquia (definitividade vertical)
c) acto decisório das situações jurídicas (definitividade material).

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