sábado, 22 de maio de 2010

A justiça administrativa de partes

Já muito aqui se falou acerca dos modelos de justiça administrativa, das suas similitudes e diferenças, vantagens e inconvenientes, no entanto, o certo é que quando me proponho a fazer um analise do processo administrativo como sendo, hoje, de partes ou um processo do acto não posso deixar de recolher bases naquelas considerações, isto porque quando se fala em processo administrativo de partes o que se quer significar é que a justiça administrativa tem como função, mesmo que não seja a única, como não o é pois sabemos que é também seu objectivo a resolução de conflitos existentes nas relações entre entes administrativos e ate inter e intra-organicos, mesmo que isso nos possa causar, pelo menos à primeira vista, alguma estranheza (como já o meu colega Pedro Albuquerque procurou em um texto seu demonstrar) quanto a alguns pressupostos processuais, nomeadamente a personalidade jurídica dos orgaos potencialmente em conflito. Mas dizia eu que um processo administrativo de partes tem como função se não única, a principal, tutelar os direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares, daí que se diga um processo subjectivo, particulares esses que estarão em discordância com a Administração, esta ultima também uma parte no processo, e que têm como objectivo ao propor a acção ver a sua posição jurídica de vantagem tutelada e não, contrariamente ao que se verificaria e já se verificou no nosso passado onde se adoptava um modelo de cariz objectivista em que o que estava sempre em causa era a legalidade do acto praticado, note-se do acto praticado, ou seja o contencioso era todo ele baseado na ideia de recurso, recurso de um acto, este era visto como o objecto central de toda a discussão em julgamento, e para o apuramento da sua legalidade todos deveriam colaborar, alias era essa a função tanto dos particulares como da administração no processo, deveriam ser meros auxiliares no tribunal na descoberta e tutela da legalidade e consequentemente do interesse publico, nunca partes que tutelam os seus próprios interesses, como alias, no que à administração toca entendia-se que essa comungava dos mesmos interesses que o tribunal, pois ambos estariam adstritos e procurariam a mesma legalidade.
Hoje parece indiscutível que a nossa Constituição acentua a ideia de defesa plena das garantias e interesses legalmente protegidos dos particulares, apesar de não impor um modelo estritamente subjectivista, uma vez que dentro do quadro imposto de um modelo organizatório judicialista de modo a proporcionar-se uma tutela efectiva dos particulares o legislador tem liberdade na sua concretização, nomeadamente alargar o âmbito da justiça administrativa à tutela da legalidade e do interesse publico mesmo que não estejam em causa direitos dos administrados, solução alias que de certa forma é ate imposta pelo seu artigo 266º que erige o interesse publico como finalidade primeira da administração e tal alargamento é ainda justificado para as relações interadministrativas tendo em conta que a Constituição atribui à ordem judicial administrativa a competência para julgar a generalidade das questões de direito administrativo, a tudo isto acresce a consagração do direito de acção popular para a defesa de interesses colectivos, difusos ou comunitários. Ora o legislador fez de facto as suas opções nesse sentido ao adoptar os actuais ETAF e CPTA que consagram um processo administrativo de partes com alguns laivos de objectividade seja quanto a certos alargamentos na legitimidade activa, seja na previsão de litígios inter-administrativos seja, por fim, no conhecimento oficioso pelo juiz das ilegalidades do acto administrativo impugnado.

Vanessa Rodrigues, 16905 subt 12

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