segunda-feira, 24 de maio de 2010

Processo Administrativo: "processo de partes" ou "processo ao acto"?

O código consagra expressamente que tanto particulares com administração são partes no processo administrativo, ou seja, consagra-se, agora, um “processo de partes”.
Neste processo, estabelece-se já um lado subjectivo, visto que perante o juiz temos: o particular que defende a lesão de interesses próprios e a Administração, essa sim defendendo a legalidade e o interesse público, de todos nós (interessados).
Assim, tanto o particular como a Administração vão a processo, intervir enquanto partes, com todos os direitos e deveres inerentes a essa condição, embora nunca deixando de ter o dever de colaborar com o juiz.
Esta ideia encontra-se subjacente às regras comuns de legitimidade (art.9ºCPTA), uma vez que a necessidade de apurar a legitimidade depende da qualidade de parte, caso contrário não faz sentido prosseguir com o eventual processo.

Do lado oposto a este processo de partes, encontra-se a doutrina clássica de que o processo deveria ser um “processo ao acto”.
Este processo, nascido com base no modelo francês, sustenta que o contencioso administrativo era de tipo objectivo, destinado à mera verificação da legalidade de uma actuação administrativa. Assim, este processo não reconhece um direito subjectivo das partes, nem mesmo da administração, uma vez que mesmo a ela se impõe um direito objectivo, valorizando-se, desta forma, apenas o acto administrativo em si, em torno do qual girava todo o processo
Colocava-se, então, a tónica no interesse público e na necessidade da defesa da legalidade, sendo que para isso a Administração e os particulares intervinham na acção, mas apenas para colaborar na defesa desses interesses e nunca com o propósito de defenderem interesses próprios.
Quanto ao particular, segundo Erichsen-Martens seria apenas um “mero objecto do poder soberano”, isto é, o particular não tinha direitos subjectivos perante a Administração, cabendo-lhe apenas a tarefa, em processo, de defender interesses difusos de toda a população (e nunca direitos específicos, subjectivos próprios), que tivessem sido atingidos por uma actuação ilegal administrativa.
Como já se disse, a própria Administração também não é tida como parte, pois apenas está em processo para auxiliar o tribunal a prosseguir o referido interesse público de cumprimento preciso e oportuno da lei, confundindo-se quase com ele, pois ambos representam o mesmo poder soberano
Como se pode ver, este processo chega mesmo a ser contraditório, pois o particular (que não é parte) tem de se apresentar em juízo para se limitar a defender interesses públicos, não tendo um proveito próprio específico, mas apenas uma possibilidade de ver o seu direito subjectivo prosseguido desde que este esteja incluído no interesse difuso, o que pode acabar por comprometer a sua actuação.
Contrário a isto tudo, surge, então, o processo agora em vigor, que trouxe um reforço do princípio da igualdade efectiva das possibilidades de participação processual (art.6º CPTA), e erradica, ainda, a prática tradicional de que as entidades públicas estariam num patamar “superior”, nomeadamente visto que não podiam ser objecto de sanções (especialmente por litigância de má fé). Este princípio é complementado pelos princípios da cooperação e boa fé processual (art.8º,n.º1 e 2 CPA).
Em suma, poder-se-á dizer que a grande vantagem do novo processo, é que consegue retirar todas as consequências positivas de uma Justiça Administrativa jurisdicionalizada, destinada à protecção de direitos dos particulares (art. 209º e 268º,n.º4 CRP).



Eunice Ferrão Neves
Turma A - 1

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