domingo, 23 de maio de 2010

Condenação à prática de acto devido

A Administração pode não praticar um acto administrativo legalmente devido, pode oferecer o silêncio ou a recusa ao particular em vez da prática do acto que lhe foi legitimamente pedido.
A acção de condenação da Administração à prática de acto administrativo devido encontra-se prevista e regulada nos artigos 66º e seguintes do CPTA.
Através desta forma processual, o particular “enfrenta” a Administração com armas renovadas e persuasivas capazes de o defender da inércia ou teimosia administrativas.
É possível, então, caracterizá-la como uma modalidade de acção administrativa especial, decorrente do Princípio de tutela jurisdicional plena e efectiva dos direitos dos particulares em face da Administração, de acordo com o artigo 268º/4 da CRP.
Desta forma, com a sua consagração expressa na revisão constitucional de 1997, foram finalmente superados alguns dos pruridos do Contencioso Administrativo.
Actualmente, este mecanismo processual tanto permite a condenação da Administração nos casos de omissão de actuação, como nos casos de emissão anterior de acto de conteúdo negativo ilegal. Existem, assim, duas modalidades de Acção Administrativa de Condenação à Prática de Acto Devido:
- Condenação na emissão de acto administrativo omitido;
- Condenação na produção de acto administrativo favorável ao particular, em substituição do acto desfavorável anteriormente praticado;
O CPTA adopta uma concepção ampla quanto ao objecto do processo, valorizando o pedido mediato sobre o imediato.
Contudo, os pedidos de condenação da Administração à prática de actos administrativos devidos têm uma carga de tutela subjectiva, de protecção de direitos ou interesses individuais.
Os particulares podem vir a ver praticado um acto administrativo que, nos termos da lei, o deveria ter sido, porque a sua omissão ou recusa afectou negativamente os seus direitos subjectivos ou os seus interesses legítimos.
A delimitação do conceito de acto administrativo devido não pode, no entanto, ignorar que o juiz administrativo não tem por missão controlar o mérito ou a oportunidade da actuação administrativa pública, apenas lhe cabendo julgar do cumprimento pela administração pública das normas e dos princípios jurídicos a que deve obediência.
Significa isto que, a determinação daquilo que se haverá de considerar legalmente devido pela administração pública surgirá da análise dos elementos discricionários e vinculados da decisão administrativa; devida será sempre uma resposta do órgão competente ao requerimento do particular, seja ela favorável ou desfavorável; todavia, devida será apenas a prática de um acto cujo conteúdo seja determinado pelas vinculações legais que parametrizem tal prática.
O pedido de condenação à prática do acto administrativo devido só pode ser formulado quando se verifique umas das circunstâncias previstas no nº1 do artº 67º do CPTA:
a) Quando o órgão competente para a prática do acto sobre quem impende o dever legal de o praticar não o tenha feito dentro do prazo legalmente estabelecido;
b) Quando a prática do acto devido tenha sido recusada pelo órgão competente;
c) Quando o órgão competente para a prática do acto administrativo tenha recusado a apreciação de requerimento dirigido à sua prática.
Note-se que, a lei, ao prever estas três circunstâncias, teve presente que o órgão administrativo competente tem sempre o dever de se pronunciar sobre os requerimentos dos interessados.
Mas isto não significa que tenha sempre a obrigação de decidir favoravelmente tais pedidos.
Na realidade, o dever que recai sobre o órgão competente para decidir é o de tomar uma decisão que respeite todas as vinculações absolutas (forma, formalidades, fins, …) e que concretize suficientemente as vinculações tendenciais decorrentes dos princípios constitucionais condutores da actividade administrativa (igualdade, imparcialidade, proporcionalidade, boa fé, …). É apenas isto que o tribunal administrativo pode apreciar, porque é somente isto que é legalmente devido.
Em meu entender, é este o sentido da regra fundamentalndo nº2 do artº 71º do CPTA: para um acto administrativo com um conteúdo específico ser devido é indispensável que a lei permita afastar, como ilegal, todo e qualquer acto de conteúdo diverso.

Sem comentários:

Enviar um comentário