segunda-feira, 24 de maio de 2010

Intimação para um comportamento - visão "tributária"

A utilização do meio processual previsto no artº 147º do CPPT, como corolário do direito à tutela judicial efectiva prevista no artº 268º, nº4 da CRP, que visa obter o cumprimento de um dever pela administração tributária, pressupõe que esteja definida previamente a existência desse dever, podendo este resultar directamente da lei, quando se esteja face a direitos cuja existência não necessite de actos de aplicação ou decorra de determinada situação fáctica.

Os pressupostos da intimação para um comportamento são:
a) existência de uma omissão por parte da administração tributária;
b) a omissão tem que se referir a um dever de uma prestação jurídica;
c) a omissão seja susceptível de lesar um direito ou interesse legítimo do interessado;
d) este meio processual ser o mais adequado para assegurar a tutela plena, eficaz e efectiva do direito ou interesse em causa.

O dever de pronúncia da administração pode consistir em dever de decisão, nos casos em que o assunto apresentado seja uma questão a resolver através de acto administrativo, desde que se verifiquem os pressupostos procedimentais subjectivos: competência do órgão que recebe o pedido do requerente; os pressupostos procedimentais objectivos: intelegibilidade, unidade e tempestividade do pedido, actualidade do direito que se pretende exercer e inexistência de decisão sobre pedido igual (do requerente) tomada há menos de dois anos (artº 56º da LGT e artº 9º do CPA)

Desencadeado um procedimento tributário, por exemplo de pedido de reembolso de IRC retido na fonte, tem a administração tributária o dever de decidir o mesmo, no prazo estabelecido no artº 57º, nº1 da LGT, isto é, no prazo de seis meses; não o fazendo, estamos perante a existência de uma omissão por parte da administração tributária, ou seja, omissão da conclusão do procedimento tributário no prazo legal, conclusão que consiste num dever de uma prestação jurídica, sendo tal omissão susceptível de lesar direitos ou interesse legítimo da recorrente, direito a ver decidido o seu pedido no prazo legal, por forma a ver definida a sua situação relativamente ao seu alegado direito à restituição do IRC retido na fonte, pois estando a administração tributária vinculada ao princípio constitucional da legalidade na prática dos seus actos, deverá a mesma observar o princípio da celeridade relativamente aos prazos para a respectiva prática.

Os requisitos específicos da sentença, em processo de impugnação judicial encontram-se previstos nos artºs 123º e 124º do CPPT, normas a integrar com as previstas nos artºs 659º e ss do CPC, em tudo o que não estiver especialmente previsto no CPPT.

Nos termos do disposto no artº 123º, nº2 do CPPT, relativamente à fundamentação de facto da sentença, o juiz terá de indicar, cumulativamente, quais os factos provados e quais os factos não provados. Esta exigência, não prevista no processo civil, tem a sua razão de ser no facto de, no contencioso tributário, não haver lugar ao julgamento da matéria de facto, por meio de despacho ou de acórdão, como ocorre no processo civil de acordo com o disposto no artº 653º, nº2 do CPC, pelo que, no contencioso tributário, onde não há elaboração de base instrutória (prevista no artº 511º do CPC), é na própria sentença que tal julgamento se terá de efectuar, assim se entendendo a exigência do artº 123º, nº2 do CPPT, pois esse momento processual – elaboração da sentença – é o único possível para efectuar o julgamento da matéria de facto, discriminando-se os factos provados dos não provados.

A fórmula genérica encontrada pelo tribunal a quo para a discriminação dos factos não provados, referindo estes por mera exclusão de parte dos provados, com remissão para os factos constantes dos articulados, não sendo rigorosa, sendo absolutamente vaga, não obedece ao disposto no artº 123º, nº2 do CPPT, pois os factos julgados como não provados não são aqueles que sobram nos articulados, depois de efectuado o julgamento sobre os provados, mas sim aqueles que, com relevância para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, não se provaram nos autos.

A falta de discriminação da matéria de facto não provada, em sede de contencioso tributário, é equiparável à falta de indicação da matéria de facto provada, relevando a sua omissão para efeitos da nulidade da sentença prevista no artº125º, nº1 do CPPT. “No entanto, a falta de discriminação dos factos não provados, como a dos factos provados, só será necessária relativamente a factos que possam relevar para a apreciação da causa, segundo as várias soluções plausíveis de direito (arts. 508º-A, nº1, alínea e), 511º e 659º do CPC), o que é corolário da norma genérica vigente no nosso direito processual da proibição da prática de actos inúteis (art. 137ºdo CPC). Por isso, só existirá nulidade de sentença por falta de indicação dos factos não provados relativamente a factos alegados que não tenham sido dados como provados nem não provados e que possam relevar para a decisão da causa.”

O dever de motivação da matéria de facto a que alude o artº 653º, nº2 do CPC não tem nada a ver com a fundamentação da sentença final a que alude o artº 668º, nº1-b) do CPC, referindo-se tal dever apenas à fundamentação da matéria de facto, enquanto que o dever de fundamentação previsto no artº 668º, nº1-b) do CPC refere-se à fundamentação da decisão final, quanto aos fundamentos de facto e de direito que a justificam, não estabelecendo a lei qualquer sanção para a falta de fundamentação da matéria de facto, sendo as nulidades da sentença as taxativamente fixadas no artº 668º do CPC. Em caso de violação do preceito contido no artº 653º, nº2 do CPC ocorrerá uma nulidade processual sujeita ao regime legal dos artºs 201º e ss do CPC, desde que tal violação influa na decisão da causa.

A nulidade da sentença por falta de fundamentação de direito só ocorre quando tal falta for absoluta.

Na perspectiva das garantias das partes no processo, as soluções contidas no artº 690º-A do CPC, facultam às partes na causa uma maior e mais real possibilidade de reacção contra eventuais erros do julgador na livre apreciação das provas e na fixação da matéria de facto relevante para a solução jurídica do pleito, desde que o recorrente cumpra o ónus de motivar o seu recurso com indicação das provas que, no seu entendimento, impunham diversa decisão sobre a matéria de facto.

Armando Rosa, 16696, subturma 12

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