sábado, 22 de maio de 2010

A Plena Jurisdição do Contencioso Administrativo

Foi com base num preceito constitucional que a Reforma da Administração se deu. O art.268º/4 da Constituição da República Portuguesa (doravante, C.R.P.) que estabelece um direito fundamental dos particulares em verem assegurada uma tutela efectiva e plena dos seus interesses legalmente protegidos impulsionou as alterações legislativas no sentido de passarem a haver diversos meios processuais. Está, portanto, na vasta liberdade do legislador concretizar o modelo organizatório judicialista e, uma protecção efectiva dos direitos, uma vez que os administrados têm o “direito a um procedimento”.

Então assistiu-se a uma subjectivação da justiça administrativa, onde passou a haver um processo de partes, e um alargamento dos poderes de decisão do juiz face à Administração, passando-se assim a respeitar o espaço dado à autonomia da valoração da lei administrativa, bem como, a aceitação da estabilidade das decisões dos actos administrativos. Com estas mudanças foi evidente a superação dos ditos “ traumas da infância difícil do contencioso administrativo, como salienta o Prof. Vasco Pereira da Silva, pois acabavam as dúvidas trazidas pela fase do Administrador-juiz, onde os poderes eram essencialmente de anulação dos actos administrativos. Agora a plena jurisdição administrativa trata estes tribunais como verdadeiros tribunais autónomos com valores próprios e uma disciplina separada. Aqui é importante para a tutela de cada direito específico, a adequada utilização do meio processual.
O Código de Processo nos Tribunais Administrativos, doravante CPTA, elenca diversos meios processuais possíveis. A acção administrativa comum (art.37º e seguintes do CPTA), especial (art.46º e ss. CPTA), processo cautelar e processo executivo, art. 112º e 157º, respectivamente.
Para distinguir entre acção administrativa comum e especial atende-se ao critério que refere a acção especial como a que diz respeito aos processos relativos a actos e regulamentos administrativos, e os restantes litígios integram a acção administrativa comum. Dentro de cada uma destas acções cabem várias modalidades de sentenças (de simples apreciação, de anulação, condenação) e, pedidos susceptíveis de serem formulados. A delimitação do âmbito da aplicação da acção administrativa comum ou especial levanta sérias dúvidas, uma vez que segundo o Prof. V. Pereira da Silva esta não é justificada por ter “pré-conceitos” de carácter substantivo no seu fundamento. O Professor critica, também, a denominação da acção administrativa especial pois, a acção administrativa especial é a mais frequente no processo e assim a mais “comum”, e dentro da acção especial existem ainda sub-acções especiais, como é o caso da acção de especial de impugnação do acto administrativo, que aquele ironiza tratando por “especialíssimas”. Nas acções especiais existem regras uniformes mas, também, regras que atendem às particulares das acções em questão, como está patente nos art.35º/2 e, art.50º e ss e 60º e ss do CPTA.

Mas, para além, desta dicotomia entre estes meios processuais, existem ainda vários aperfeiçoamentos no processo relevantes de salientar. A tutela cautelar está também presente nesta Reforma, com o art.2º/1CPTA; e a amplitude de cumulação de pedidos em função da matéria de facto ou de direito (art.4º e 47º CPTA). Quanto à legitimidade, alarga-se às pessoas colectivas, órgãos administrativos e aos intervenientes na acção popular. Já o Ministério Público cabe o papel da fiscalização da legalidade, com o poder geral de iniciativa, o poder de dar pareceres de mérito e a invocação de novos vícios, embora a sua intervenção venha agora a ser limitada à fase instrutória.
Outra questão importante é se a Administração se limita à apreciação de legalidade ou também sobre o mérito das decisões. É clara a sua intervenção nos dois níveis pois, não só julga o cumprimento do direito mas, por exemplo, também emite sentenças substitutivas. O art.7º CPTA vem reforçar esta ideia ao dizer que a justiça material não implica apenas uma mera apreciação formal do litígio. Quanto aos meios probatórios o art.35º/1 do Código do Procedimento Administrativo vem consagrar a sua admissibilidade.

Finalmente, foi no âmbito de uma Administração moderna Prestadora e Infra-estrutural que se consagrou o principio de igualdade de armas entre o recorrente e a Administração no processo, este que deixou de ser um processo de recursos mas agora de acções judiciais, onde não é possível invadir a competência reservada à Administração.
O contencioso passa da mera anulação para a plena jurisdição!





Elementos Bibliográficos:
• SILVA, Vasco Pereira da, O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise, 2.ª edição, Almedina, Coimbra, 2009
• ANDRADE, Vieira de, A Justiça Administrativa, Almedina, Coimbra, 2007
• ALMEIDA, Mário Aroso de, O Novo Regime do Processo Administrativo, Almedina, Coimbra, 2005

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